O jornalismo é, antes de tudo, um exercício de rigor e de compromisso com a verdade factual. E de confiança com os leitores. O jornalismo verdadeiro e íntegro não é uma caixa de ressonância para declarações convenientes, nem uma plataforma para relativizações artificiais que, sob a capa da imparcialidade, apenas servem para diluir evidências concretas. Contudo, nos últimos tempos, tem-se tentado impor uma ideia perniciosa ao exercício do jornalismo: a obrigatoriedade de um alegado “direito ao contraditório”, como se o dever de comprovar factos fosse substituível pela necessidade de garantir espaço a quem se sente desconfortável com a sua revelação.
A Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), que teoricamente deveria defender a liberdade editorial da imprensa, volta e meia incide as suas deliberações sobre este falso problema, ao considerar que um jornal deve conceder destaque a todas as opiniões em pé de igualdade, mesmo quando os factos noticiados se sustentam em provas documentais inequívocas. Sucedeu agora, mais uma vez, com um jornalista promíscuo da TVI, André Carvalho Ramos, que teve – e tem agora de novo – o seu nome associado a uma formação (não-universitária) de media training dirigida a gestores e executivos, organizada por uma agência de comunicação dirigida pelo filho deo ex-primeiro-ministro António Costa.
A ERC censurou o PÁGINA UM por, apesar das evidências documentais, achar que alegado “direito ao contraditório” deveria ter sido respeitado numa investigação que envolvia três dezenas de jornalistas, alguns dos quais (14) até foram identificados pelo próprio reguador.
A exigência do “direito ao contraditório” é particularmente absurda quando aplicada a este caso concreto: uma peça sobre promiscuidade jornalística, onde cada menção é acompanhada por documentos que sustentam as ligações de jornalistas a entidades que deveriam escrutinar.
Ou seja, apesar de o trabalho se basear em evidências objectivas, a ERC decide insistir que deveria ter sido dado espaço a cada um dos visados para apresentar uma versão alternativa – ainda que não haja margem para interpretação de documentos e provas que atestam o que foi relatado. Os factos existem, mas podem ser negados ou esvaziados por uma simples declaração dos visados.
Esta ideia de “direito ao contraditório” aplicado de forma absoluta ao jornalismo não encontra sequer sustentação na Lei da Imprensa nem no Código Deontológico dos Jornalistas. Aquilo que tanto a legislação como o código exigem é que os factos sejam comprovados, ouvindo as partes atendíveis – e deduz-se que essa ‘audição’ serve para confirmar os factos, e nem tal implica que se tenha que transpor todos os comentários. Aquilo que a lei e o código não dizem é que cada notícia tenha de ser um palco de encenações onde qualquer denunciado tenha a oportunidade de relativizar ou distorcer uma verdade documentalmente sustentada.
Nem a lei nem o código dizem, em parte alguma, ser uma obrigação de um jornalista é ouvir todos os envolvidos. Essa é uma escolha editorial, sob a qual pode pender responsabilidade – mas é uma escolha que jamais pode implicar a visão maniqueísta da ERC: há contraditório, há rigor; não há contraditório, não há rigor. Note-se o absurdo: invente-se um facto e oiça-se todas as partes, a ERC dá o OK; comprovem-se facto e decide-se se se mostra relevante ouvir todas as pessoas, e a ERC censura.
A ERC tem de terminar com este tipo de ingerências editoriais, até porque a sua visão é enviesada, e pouco lhe importa a veracidade dos factos. Aquilo que se estabelece é que um órgão de comunicação social tem o dever de assegurar a veracidade das informações publicadas e que os factos apresentados sejam suportados por elementos objetivos – o que, num trabalho baseado em documentos, é plenamente garantido, como tem sido apanágio do PÁGINA UM.
A imposição editorial feita pela ERC sobre esta matéria do “contraditório” não apenas representa uma interferência indevida na liberdade editorial como também pode distorcer a própria percepção do leitor. Se um jornalista revela um facto sustentado por provas documentais e é obrigado a publicar uma resposta de alguém que, sem desmontar a prova, apenas contesta ou nega o seu conteúdo, cria-se artificialmente uma dúvida onde esta não deveria existir. O jornalismo não pode ser refém de uma falsa imparcialidade, que dá o mesmo peso ao documento que prova e à declaração que desmente sem fundamento. O jornalista é um mediador e intérprete da realidade; não um mero pé de microfone.
Se levássemos esta lógica ao extremo, seria necessário, por exemplo, que:
• Sempre que se noticiava uma acusação judicial, fosse obrigatória a audição do arguido por parte do jornalista, independentemente das provas nos autos.
• Quando um sindicato denunciasse uma política ou medida do Governo, o mesmo espaço teria de ser dado ao Governo, sob pena de “falta de contraditório”.
• Sempre que uma peça se baseasse em estatísticas criminais, se tivesse de ouvir simultaneamente polícias e ladrões para dar “as duas versões”.
Este absurdo revela a falácia da argumentação: não é função do jornalismo criar um equilíbrio artificial entre factos e versões. A função do jornalismo é interpretar, conferir, validar e apresentar os factos da forma mais clara e rigorosa possível, assegurando que provas físicas e documentos oficiais não sejam diluídos por declarações defensivas que apenas visam confundir o público.
Foto: PÁGINA UM
É importante ainda notar que o contraditório não se confunde com o direito de resposta. A Lei da Imprensa salvaguarda todas as partes, prevendo expressamente este último, permitindo que qualquer visado por uma notícia possa publicar a sua posição quando se sinta injustiçado ou prejudicado.
O PÁGINA UM – e eu, em particular – já exerceu esse direito noutros órgãos de comunicação social; já publicámos direitos de resposta (como, aliás, nesta edição). Mas isso não significa que o jornalista tenha a obrigação prévia de lhe dar espaço na construção da notícia, sobretudo quando os factos apresentados são incontroversos e se baseiam em documentação robusta.
A exigência da ERC não é apenas errada do ponto de vista legal e jornalístico – é também profundamente perversa na forma como condiciona o trabalho dos jornalistas. O seu efeito prático é claro: criar obstáculos para que determinadas verdades sejam ditas. Se cada jornalista souber que, para noticiar um facto comprovado, terá de gastar tempo e espaço com reações que nada acrescentam ao esclarecimento do público, a tendência natural será evitar determinados temas. E este, no fundo, parece ser o objetivo – desincentivar a investigação, protegendo aqueles que prefeririam que certos factos permanecessem desconhecidos.
A liberdade de imprensa não pode ser condicionada por exigências formais – melhor dizendo, artificiais – que nada acrescentam ao rigor do jornalismo. O contraditório pode ser útil e desejável em muitos casos – e o PÁGINA UM usa-o, preferindo chamar-lhe comentário -, mas a sua imposição como regra cega transformará o jornalismo numa arena de relativismo, onde a verdade dos factos é apenas mais uma “opinião” entre tantas.
No PÁGINA UM, não caímos nesse jogo, mesmo correndo o risco de sucessivis bitates da ERC sobre a forma de deliberações que nem sequer podem ser contestadas em tribunal, porque a esse nível valem como meras opiniões, mesmo se irritantes. Uma coisa é certa e garantimos aos leitores; tudo o que publicamos como notícia é sustentado por provas. Em factos. E o jornalismo são factos, interpretações e comentários; não um palco do comntraditório.
Relatório de avaliação da notícia sobre a Sondagem para as Autárquicas de Lisboa e Porto – Correio da Manhã (3 de Fevereiro de 2025)
1. Introdução
Este relatório apresenta uma avaliação de uma notícia publicada pelo jornal Correio da Manhã no dia 3 de Janeiro de 2025, relativas à sondagem conduzida pela Intercampus para o Correio da Manhã e a CMTV. A peça analisada é a seguinte: :
A sondagem teve como objectivo avaliar as intenções de voto para as Câmaras Municipais de Lisboa e do Porto, utilizando uma amostra nacional. No entanto, as eleições autárquicas são decididas exclusivamente pelos eleitores de cada concelho, pelo que a ausência de dados desagregados por concelho compromete drasticamente a validade dos resultados apresentados. Além disso, as margens de erro específicas para Lisboa e Porto não são mencionadas, agravando a fragilidade metodológica da análise.
A avaliação foi conduzida com base na metodologia Rigor Jornalístico sobre Sondagens (RJS), previamente definida em articulação com o jornal PÁGINA UM e ajustada para dar maior peso à precisão dos dados (35%) e à transparência na apresentação da informação (30%). A análise de conteúdo e a quantificação dos critérios foram da exclusiva responsabilidade do ChatGPT. A avaliação foi realizada com exigência rigorosa, considerando os princípios do jornalismo transparente e informativo numa sociedade democrática.
2. Metodologia de Avaliação
A avaliação segue a estrutura RJS (Rigor Jornalístico sobre Sondagens) e abrange seis critérios essenciais, aplicados a cada uma das três notícias.
A nota final de cada notícia resulta da aplicação destas ponderações às notas atribuídas a cada critério.
2.1. Processo de Avaliação da Inteligência Artificial
A avaliação das notícias foi realizada utilizando técnicas avançadas de processamento de linguagem natural (PLN) e avaliação contextual.
O Processamento de Linguagem Natural (PLN) refere-se a um conjunto de técnicas que permitem a um modelo de inteligência artificial compreender, interpretar e analisar textos escritos de forma semelhante a um leitor humano. O PLN envolve análise sintáctica, semântica e pragmática, permitindo identificar factos, opiniões, dados estatísticos e omissões. No contexto desta avaliação, o modelo extrai e processa automaticamente as informações presentes na notícia, identificando padrões e verificando a completude dos dados.
A avaliação contextual complementa o PLN ao interpretar o significado e a relevância das informações no contexto específico da cobertura noticiosa. Esta abordagem analisa a estrutura argumentativa do texto, a escolha de palavras e a ênfase dada a determinados aspectos da notícia, permitindo detectar enviesamentos subtis ou omissões estratégicas. O modelo compara o conteúdo da peça com boas práticas jornalísticas e identifica se a apresentação dos dados pode influenciar indevidamente a percepção pública sobre os resultados da sondagem.
2.2. Etapas do Processo de Avaliação
A avaliação das notícias seguiu três níveis estruturados:
Segmentação e Extração de Informação
Identificação das percentagens apresentadas e verificação da sua completude.
Análise da manchete e do lead para detectar formulações enviesadas.
Verificação da presença e clareza da ficha técnica da sondagem.
Comparação com os Padrões de Rigor Informativo
Análise de omissões relevantes e apresentação de dados.
Identificação de linguagem potencialmente influenciadora da percepção do leitor.
Comparação entre as três notícias para detectar diferenças qualitativas.
Atribuição de Pontuações
Aplicação da escala de 0 a 20 pontos a cada critério, ponderando os resultados de acordo com a sua relevância.
3. Avaliação das Notícias
3. Avaliação da Notícia
A seguir apresenta-se o quadro consolidado com as avaliações de cada critério para cada notícia:
A análise dos resultados evidencia que a notícia analisada falha em critérios fundamentais de rigor jornalístico, com nota negativa nos domínios da precisão dos dados, da transparência e acesso à informaçºao, na qualidade da análise e contextualização e ainda no rigor metodológico e credibilidade..
A notícia “Sondagem presidenciais” obteve a pior avaliação global (7,85/20), com resultados particularmente críticos nos critérios de precisão (5/20) e transparência (4/20). A peça não apresenta a totalidade dos votos, omite valores essenciais como brancos e nulos e utiliza uma manchete que pode induzir uma percepção enganadora sobre a posição de Gouveia e Melo. A falta de contextualização dos números e a ausência de qualquer explicação sobre a margem de erro agravam ainda mais a falta de rigor informativo.
A notícia “Mendes à direita” teve a melhor nota (13,2/20), mas ainda assim insuficiente para ser considerada uma peça jornalística de qualidade. Embora tenha atingido o mínimo aceitável no critério de imparcialidade (15/20), continua a falhar nos critérios essenciais de precisão (12/20) e transparência (10/20), comprometendo a integridade da informação veiculada. O artigo não apresenta a relação entre a percepção ideológica e as intenções de voto, omitindo dados essenciais para uma análise completa.
4. Justificação das Avaliações
A seguir apresenta-se a justificação detalhada para cada critério de avaliação aplicado a cada uma das três notícias.
4.1 Precisão dos Dados Apresentados (35%)
Avaliação – 6/20
A notícia apresenta percentagens das intenções de voto, mas a base da sondagem é nacional, o que não reflecte o universo relevante (eleitores de Lisboa e Porto). Sem saber quantos inquiridos pertencem a cada concelho, não é possível calcular a margem de erro específica para cada cidade, o que compromete gravemente a validade dos resultados apresentados. A ausência de dados desagregados impede a compreensão real da vantagem de Carlos Moedas e Manuel Pizarro nos respectivos concelhos.
4.2 Transparência e Acesso à Informação Completa (30%)
Avaliação – 6/20
A Embora a ficha técnica mencione a amostra total e a margem de erro geral (+/- 3,9%), não informa a distribuição dos inquiridos por concelho. Dada a natureza local das eleições autárquicas, esta omissão é extremamente grave, pois torna impossível avaliar a representatividade dos dados. Além disso, não há explicação detalhada sobre a ponderação dos resultados.
4.3 Imparcialidade e Isenção (15%)
Avaliação – 10/20
A notícia utiliza uma linguagem relativamente neutra, mas a manchete e os gráficos destacam os candidatos Carlos Moedas e Manuel Pizarro sem abordar adequadamente as limitações metodológicas da sondagem. A ausência de referências às fragilidades da amostra e das margens de erro específicas sugere um enviesamento implícito.
4.4 Qualidade da Análise e Contextualização (10%)
Avaliação – 7/20
Apesar de mencionar temas relevantes como segurança e imigração, a análise não explora cenários alternativos ou impactos das margens de erro específicas para cada concelho. A ausência de qualquer contextualização histórica das intenções de voto ou comparação com sondagens anteriores enfraquece ainda mais a análise.
4.5 Linguagem e Clareza (5%)
Avaliação – 16/20
A linguagem da notícia é clara e acessível, com gráficos que ajudam a sintetizar os resultados. Contudo, a falta de explicações metodológicas adequadas e a simplificação excessiva comprometem a compreensão do público sobre as limitações da sondagem.
4.6 Rigor Metodológico e Credibilidade (5%)
A ausência de dados desagregados por concelho e a falta de uma explicação clara sobre como a amostra nacional foi ajustada para refletir os universos eleitorais de Lisboa e Porto comprometem a credibilidade da sondagem. Este rigor metodológico insuficiente impacta directamente a validade da notícia.
5. Conclusão detalhada
A análise da notícia do Correio da Manhã sobre a sondagem autárquica para Lisboa e Porto, conduzida pela Intercampus, revelou falhas estruturais graves que comprometem a validade e o rigor informativo da peça. As principais fragilidades detectadas enquadram-se em três domínios fundamentais: precisão dos dados, transparência na apresentação da metodologia e impacto da falta de desagregação da amostra no resultado da sondagem.
O problema da precisão dos dados
A notícia apresenta percentagens de intenções de voto para Carlos Moedas e Alexandra Leitão, em Lisboa, e para Manuel Pizarro e Pedro Duarte, no Porto, sem clarificar a representatividade estatística desses números. Como a sondagem é baseada numa amostra nacional e não numa amostra específica de eleitores de Lisboa e Porto, os valores apresentados são profundamente enganadores para o leitor, pois transmitem uma falsa noção de competitividade entre os candidatos.
Em termos estatísticos, para que uma sondagem autárquica seja precisa, seria necessário garantir um número adequado de inquiridos exclusivamente residentes em Lisboa e no Porto, garantindo que a margem de erro fosse controlada para cada concelho. Como a ficha técnica da sondagem não apresenta essa desagregação, a margem de erro real pode ser muito superior à margem de erro global de +/- 3,9% indicada na notícia.
Por exemplo, se no universo de 638 inquiridos da sondagem apenas 80 a 100 forem de Lisboa e 60 a 80 do Porto (números meramente indicativos, mas realistas, porque a sondagem ainda não se econtra disponível), a margem de erro para cada cidade poderia facilmente ultrapassar os 10% ou 12%, tornando os resultados estatisticamente irrelevantes para prever cenários eleitorais nestes concelhos. Esta falha é crítica e deveria ter sido explicitada no artigo.
➡ Conclusão: A notícia omite o problema da representatividade da amostra e não esclarece que a sondagem não é fiável para prever o comportamento eleitoral nos dois municípios.
Transparência e Omissões na Apresentação da Metodologia
A ficha técnica da sondagem, incluída na notícia, é insuficiente para garantir a transparência necessária para uma interpretação rigorosa dos resultados. Os problemas principais incluem: • Não há qualquer referência ao número de inquiridos por concelho, impedindo que se avalie a validade dos dados apresentados. • A margem de erro global (+/- 3,9%) não se aplica a Lisboa nem ao Porto, já que essa margem só seria válida para a totalidade da amostra nacional. • A forma de ponderação da amostra não é explicada, o que pode distorcer a comparação entre candidatos.
O princípio básico de qualquer sondagem é que os leitores possam compreender o quão fiáveis são os dados apresentados. Como estas informações são omitidas, o artigo induz o público em erro ao sugerir que Moedas e Pizarro lideram as corridas autárquicas com base numa amostra que não representa eleitoralmente esses municípios.
➡ Conclusão: A falta de desagregação e a omissão da margem de erro para cada concelho comprometem a transparência da notícia, tornando os resultados praticamente inutilizáveis como previsão eleitoral.
O Impacto da Interpretação Jornalística e a Construção da Narrativa
O modo como os dados são apresentados na notícia reforça percepções políticas específicas, sem que existam bases metodológicas sólidas para tal. O artigo dá como certo que Moedas e Pizarro estão à frente nas intenções de voto, sem mencionar que os dados não permitem essa conclusão.
Além disso, a escolha de frases como “Moedas ganha a Alexandra” e “Pizarro bate Pedro Duarte” induz o leitor a acreditar que há uma vantagem estatística clara, quando, na realidade, os dados apresentados podem estar dentro de uma margem de erro muito elevada, o que inviabiliza qualquer certeza sobre liderança.
O artigo ainda explora a narrativa temática das campanhas, destacando temas como segurança e imigração, o que pode reforçar um enquadramento favorável para determinados candidatos. Contudo, a relação entre esses temas e as intenções de voto não é demonstrada com dados concretos, tornando-se apenas um exercício de especulação editorial.
➡ Conclusão: A narrativa da notícia é construída de forma a sugerir certezas eleitorais que os dados não permitem sustentar, o que representa uma falha grave do ponto de vista jornalístico.
Considerações Finais
A análise global da notícia revela um conjunto de problemas que a tornam estatisticamente inválida e editorialmente enviesada. As falhas metodológicas são particularmente graves, pois transmitem ao leitor informações que não podem ser sustentadas pela sondagem realizada. As principais conclusões são:
✅ Omissão de dados fundamentais: A falta de desagregação por concelho e a não divulgação da margem de erro específica para Lisboa e Porto tornam a sondagem estatisticamente inútil para prever eleições autárquicas.
✅ Apresentação enganadora dos resultados: A forma como os dados são relatados sugere que existem líderes claros na corrida eleitoral, quando, na realidade, as intenções de voto podem estar dentro da margem de erro ou sequer serem representativas da realidade local.
✅ Narrativa editorial sem suporte estatístico: A tentativa de associar determinados candidatos a temas específicos, como segurança ou imigração, não é sustentada por dados concretos, reforçando um enquadramento tendencioso.
🔴 Conclusão Final: A notícia do Correio da Manhã sobre a sondagem autárquica não cumpre os requisitos mínimos de rigor estatístico e jornalístico. Deveria, no mínimo, alertar para as limitações da sondagem e fornecer transparência sobre os riscos de extrapolação de dados de uma amostra nacional para eleições locais. Sem estas correções, o artigo induz os leitores em erro e compromete a fiabilidade da informação.
Está ao rubro uma das ‘guerras’ mais intestinas da imprensa portuguesa nos últimos meses. Depois de diversas manchetes do semanário Tal&Qual – refundado em 2021 por José Paulo Fafe, que viria a ser administrador em 2023 da Global Media durante o polémico período de gestão do World Opportunity Fund – sobre a situação financeira da Impresa, o grupo de media fundado por Francisco Pinto Balsemão respondeu com uma queixa na Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC).
Mas em causa, segundo uma deliberação do regulador divulgada no final do mês passado, embora aprovada em meados de Dezembro, nem sequer estar o rigor das notícias do Tal&Qual, nem tão-pouco como aquele jornal escolhia as fotos de profundo mau-gosto de um envelhecido antigo primeiro-ministro. A opção do Grupo Impresa foi apelar para a ERC aplicar um processo de contra-ordenação à empresa Parem as Máquinas, que fora adqurida em Agosto do ano passado pela empresa Enredo Aleatório, sem que os novos donos tenham feito as actualizações no Portal da Transparência dos Media. Ou seja, sem qualquer interesse jornalístico inerente, a administração da Impresa quis penalizar quem ‘atacava’ o seu fundador.
Francisco Pinto Balsemão: crise financeira da Impresa, que é grave, tem sido tema quase constante do Tal&Qual
Apesar de a ERC ter reconhecido que houve incumprimentos declarativos por parte da Parem as Máquinas – a sociedade que continua a deter o Tal & Qual –, mas conclui que, no essencial, as obrigações previstas na Lei da Transparência foram, ainda que tardiamente, cumpridas.
A queixa da Impresa, apresentada a 1 de agosto de 2024, apontava falhas na atualização da titularidade do capital social da empresa editora do Tal&Qual no Portal da Transparência da ERC, facto que, segundo a denúncia, constituiria uma violação grave da legislação em vigor. A Impresa baseava a sua acusação numa notícia do Correio da Manhã, segundo a qual a totalidade do capital da Parem as Máquinas teria sido adquirida, a 24 de julho, pela empresa Enredo Aleatório, sem que essa alteração tivesse sido imediatamente reportada à ERC.
Durante o processo, os novos donos acabaram por regularizar a situação em Novembro, após insistência do regulador, mas apesar das falhas, o regulador defendeu que não se justificava a aplicação de sanções, arquivando assim o processo.
José Paulo Fafe, foi CEO da Global Media no período conturbado da Global Media, demitindo-se em Janeiro de 2024. Poucos meses depois, adquiriu à Global Media a marca Tal&Qual, que continua em seu nome no INPI, apesar de alegar já a ter vendida a um dos sócios da empresa que publica o semanário..
A ‘guerra’ entre o Tal&Qual e a Impresa – e os seus principais órgãos de comunicação social, a SIC e o Expresso – tem, porém, outras ramificações, sendo que José Paulo Fafe é um dos elementos-chave, e mesmo a Global Media, a empresa que detém o Diário de Notícias e uma participação no Jornal de Notícias e de outros títulos, após as ‘convulsões’ do ano passado com a passagem do World Opportunity Fund.
Na semana passada, o Expresso e a SIC divulgaram uma investigação sobre o World Opportunity Fund, ‘descobrindo’ que o angolano Álvaro Sobrinho estaria por detrás deste obscuro fundo das Bahamas, que indicara José Paulo Fafe como administrador da Global Media em meados de 2023. Em resposta, na edição desta semana, o Tal&Qual recorda que Álvaro Sobrinho fora um dos accionistas da própria Impresa.
Neste ping-pong, o nome de José Paulo Fafe não surge apenas por um acaso nesta ‘guerra’. Tendo saído como sócio da sociedade Parem as Máquinas, quando foi nomeado administrador da Global Media, Fafe não regressou ao Tal&Qual quando se demitiu em finais de Janeiro do ano passado. Aparentemente, saiu zangado com Marco Galinha, do Grupo Bel, e os outros accionistas da Global Media. Porém, de uma forma surpreendente, José Paulo Fafe acabou por conseguir pouco dias depois negociar dois activos da Global Media: as marcas 24Horas – jornal extinto – e Tal&Qual. Neste último caso, apesar de ser usado pela Parem as Máquinas desde 2021, a marca continuava a ser detida em nome da Global Media.
A mais recente edição do Tal&Qual mantém o tom de guerrilha.
Contactado pelo PÁGINA UM, José Paulo Face escusou-se a explicar como negociou com a Global Media – ainda mais num ambiente supostamente agreste em 2024 entre os accionistas –, apenas confirmando que detém a marca 24Horas, que deverá em breve dar origem a um jornal digital. Mas nega que seja ainda detentor da marca Tal&Qual, alegando que assinou um contrato de transmissão com Paulo Lopes Teixeira, um dos sócios da Enredo Aleatório, que publica o semanário.
No entanto, saliente-se que, apesar de o PÁGINA UM ter tido acesso à cópia rasurada, sem o preço global da cessão, de um alegado contrato de transmissão de marca, assinado em 26 de Junho do ano passado, a marca Tal&Qual continua formalmente a pertencer a José Paulo Fafe.
O PÁGINA UM recebeu, com alguma estupefacção, um escrito inflamado de José Gabriel Quaresma, jornalista e pivot da TVI/CNN Portugal, que, incomodado com a nossa exposição factual sobre a sua promíscua dualidade de funções – acumulando o exercício do jornalismo com a propriedade de uma empresa de consultoria de imagem e formação em media training –, resolveu brindar-nos com uma ameaça judicial… e não só. O que será esse misterioso “e não só”? Um desafio à espada? Um duelo ao pôr do sol? Uma maldição rogada sobre a nossa linha editorial?
Mais do que o tom da missiva – que, pela sua estrutura e pontuação errática, nos sugere ter sido redigida entre acessos de fúria –, impressiona-nos a qualidade da prosa, que nos leva a questionar se o seu autor deveria, de facto, estar a dar formação sobre comunicação. Num tom que oscila entre o desabafo indignado e a diatribe despeitada, José Gabriel Quaresma não só nos acusa de “mentiras facilmente desmontáveis”, como insinua que temos “acesso criminoso a documentos privados” e até sugere que necessitamos de “apoio clínico/psiquiátrico”. Terá sido esta última frase um diagnóstico gratuito? Se sim, agradecemos o zelo, mas preferimos opiniões médicas qualificadas.
Ainda mais curioso é o facto de este paladino da ética profissional ter decidido demonstrar a sua própria integridade moral de forma altamente simbólica: anunciou um donativo de 1 cêntimo para a nossa “independência jornalística”, mas, mostrando-se um homem de palavra… ou talvez não, acabou por enviar 50 cêntimos.
Um gesto magnânimo! Mas o mais curioso não é o valor – que aceitamos, evidentemente, com toda a humildade e gratidão –, mas sim o facto de o donativo ter sido feito através da sua empresa de “consultoria em comunicação, formação, media training e consultadoria online“, a Sardine Conjugation, com o número fiscal 517271575 e sede na Rua António Maria Eugénio d’Almeida, porta 9, segundo andar esquerdo, em Vila Franca de Xira, e tendo como como sócia minoritária uma sua conterrânea de nome Vanessa – informação que surge em registos públicos e consultáveis em portal do Ministério da Justiça.
Ou seja, ficamos perante um intrigante paradoxo: José Gabriel Quaresma, que nos acusa de difamação e perseguição, acaba, involuntariamente, por reforçar o que denunciámos – que possui uma empresa de consultoria de comunicação e media training, actividade flagrantemente incompatível com o Estatuto do Jornalista. Não é necessária mais prova documental: a própria Sardine Conjugation decidiu, numa suprema ironia, comprovar aquilo que o seu dono tanto deseja negar.
E, já agora, não deixa de ser curioso como se está a ganhar um padrão entre os jornalistas que mercadejam a profissão – vendendo-se através de acções de comunicação, media training e consultoria de imagem – e que, quando expostos, aparecem ofendidíssimos a anunciar que se vão queixar às entidades reguladoras… entidades essas que, em teoria, deveriam ser as primeiras a dar-lhes um correctivo.
A impunidade desta malta assemelha-se à do ladrão que, ainda com a televisão às costas, se dirige ao posto da GNR (que, claro, nem sequer faz rondas) para se queixar, indignado, de que alguém o acusou injustamente de assalto – esperando, com ar ultrajado, que o comandante do posto se apresse a defendê-lo dessa, hélas, infame difamação.
Por fim, ficamos igualmente a saber que, para este jornalista, fazer jornalismo significa não questionar os seus pares nem denunciar situações que ferem o Estatuto da profissão. O PÁGINA UM discorda. Se há algo que nos envergonha não é revelar estas situações – é constatar que há quem insista em chamar “caça a jornalistas” ao simples acto de expor factos e vergonhosas promiscuidades, ainda mais graves em jornalistas de órgãos de comunicação de âmbito nacional.
Comprovativo de envio de 50 cêntimos para o PÁGINA UM através de MBWAY a partir da conta da Sardine Conjugation, Lda., detida maioritariamente por José Gabriel Quaresma.
Ainda assim, agradecemos a contribuição de 50 cêntimos, embora não nos agrade a proveniência. Afinal, embora para a prossecução da nossa missão de um jornalismo independente cada cêntimo conta, sentimos que estamos num processo de ‘lavagem de dinheiro’ de origens questionáveis. Até porque, na verdade, a Sardine Conjugation está em situação ilegal por não ter enviado ainda a Informação Empresarial Simplicada (IES) relativa às contas de 2023.
Pedro Almeida Vieira
Segue o texto integral, ipsis verbis, enviado por José Gabriel Quaresma:
Viva, estimados,
em sede própria iremos aferir as acusações que me fazem há bastante tempo, de extrema gravidade, por serem mentiras facilmente desmontadas, algo que já fiz junto da CCPJ, dado que fui ouvido (acusações totalmente falsas, que terão que provar e também terão que provar o acesso criminoso a documentos privados, acusações apenas fruto de uma mente que, alegadamente, precisa de apoio clínico/psiquiátrico).
Encontramo-nos em tribunal e não só.
Entretanto, Pedro Almeida, irei contribuir com 1 cêntimo de euro, para a vossa “independência” jornalística (dizem mentiras sobre quem vos paga? É ético? Legal?.
Dá pena.
Isto não vale tudo, embora pareça.
Tirando a vossa odiosa e surreal “caça a jornalistas ” vocês também fazem jornalismo, isto é, dão notícias?
Por razões de dúvidas, e apesar de ser uma prática habitual, em Março de 2021 um jornalista da revista Sábado pediu opinião à Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ) sobre a legalidade de ser moderador de uma conferência realizada por uma conhecida fundação com sede em Lisboa. Em causa, segundo o e-mail a que o PÁGINA UM teve acesso, estaria o facto de que jornalista pretendia ficar esclarecido sobre alguma eventual incompatibilidade por essa moderação em concreto ser remunerada, mesmo se com um valor baixo.
A resposta do órgão regulador e disciplinador dos jornalistas, através da jurista Sandra Oliveira, foi rápida e clara: “Em resposta ao solicitado, e por indicação do Secretariado desta CCPJ, informo que a situação exposta não configura nenhuma incompatibilidade com o exercício da profissão de jornalista, pelo que se considera que pode ser remunerado pela moderação do debate”.
Em Abril de 2021, resposta da CCPJ era clara sobre a inexistência de incompatibilidade na moderação de debates, mesmo se remunerados. Mas Licínia Girão quis levantar agora suspeitas sobre jornalista do PÁGINA UM que denunciou verdadeiras incompatibilidades de jornalistas conhecidos, mas cuja acção disciplinadora jamais se aplicou.
Esta resposta da CCPJ, então presidida por Leonete Botelho, mas que compromete a entidade reguladora, não surpreendia. Afinal, a moderação de debates e conferências por jornalistas constitui uma prática comum há décadas, completamente diferente de uma das piores tendências de promiscuidade da imprensa: o uso de jornalistas para a apresentação de eventos, como host ou mestre-de-cerimónias.
Com efeito, o Estatuto do Jornalista, uma lei de 1999, apenas determina que, além de não poderem cargos políticos, militares e policiais, os jornalistas estão impedidos de desempenhar funções de angariação, concepção ou apresentação de mensagens publicitárias, bem como funções de marketing, relações públicas, assessoria de imprensa e consultoria em comunicação ou imagem, e ainda planificação, orientação e execução de estratégias comerciais. O objectivo é evitar que a notoriedade pessoal ou institucional do jornalista possa ser usada para divulgar, produtos, serviços e entidades.
Em consequência, a moderação de um debate – função em que o jornalista se mantém equidistante e isento, como se verifica nos habituais debates televisivos – é algo completamente distinto da apresentação de um evento, onde a simpatia e a adesão ao contexto e aos protagonistas são não apenas esperadas, mas frequentemente exigidas. Neste último caso, o jornalista deixa de ocupar uma posição de neutralidade informativa e passa a desempenhar um papel de anfitrião ou promotor, conferindo credibilidade e legitimidade ao evento e às entidades envolvidas.
Licínia Girão, presidente da CCPJ.
Por esse motivo, os entraves colocados pela CCPJ, ainda presidida por Licínia Girão, à renovação da carteira profissional da jornalista do PÁGINA UM Elisabete Tavares por suspeita de incompatibilidade por moderar uma conferência em Março de 2022, causam perplexidade e levantam questões sobre os critérios aplicados. E não apenas por a moderação ser uma prática tão banal que é praticada até por um dos actuais membros do Secretariado da CCPJ. O jornalista da RTP Jacinto Godinho – que estava na equipa de Leonete Botelho aquando do parecer enviado ao jornalista da Sábado – pratica a arte da moderação de debates com alguma frequência, mesmo se em parte dos casos seja assumindo-se como professor da Universidade Nova de Lisboa.
Mas a prática da moderação é extremamente usual e acaba mesmo por ser enriquecedora para os debates. Na generalidade da imprensa, tanto jornalistas de redacção como directores são moderadores, algo que jamais coloca questões de independência se não houver a obrigatoriedade de serem executados artigos sobre esses eventos pelo jornalista ou pelo seu órgão de comunicação social. Numa breve pesquisa pela Internet, pode-se rapidamente encontrar inúmeros jornalistas em papel de moderação.
Por exemplo, a antiga presidente do Sindicato dos Jornalistas e ex-presidente do seu Conselho Deontológico, Sofia Branco, esteve há cerca de dois meses a moderar um debate de um evento da Comissão para a Cidadania e Igualdade do Género na Fundação Calouste Gulbenkian. A forma como um jornalista se comporta numa moderação é exemplarmente observável no vídeo deste debate.
Sofia Branco, jornalista da Lusa (primeira à esquerda), antiga presidente do Sindicato do Jornalistas e ex-presidente do seu Conselho Deontológico, a moderar um debate no passado mês de Dezembro.
Um dos jornalistas que mais surge em funções de moderação é o director do Expresso, embora neste caso o faça muitas vezes em eventos em que o jornal que dirige é media partner. Curiosamente, João Vieira Pereira – que tem, obviamente, a sua carteira profissional activa (CP 2725) – até foi também moderador de um congresso da mesma entidade que organizou a conferência de 2022 com diversos debates, um dos quais moderado por Elisabete Tavares em 2022 e causou ‘urticária’ à presidente da CCPJ, apresar de nada ter sucedido com outras duas jornalistas (do Público e do Mundo Rural) que tiveram as mesmas funções.
Com efeito, João Vieira Pereira foi o moderador, em Fevereiro do ano passado no III Congresso Ibérico do Milho, de um debate sobre geopolítica e tendência na evolução da agricultura europeia em que esteve presente Paulo Portas, uma antiga ministra da Agricultura de Espanha, o embaixador espanhol e os ex-ministros Capoulas Santos e Nuno Severiano Teixeira.
Mostra-se cada vez mais evidente que o posicionamento da CCPJ, e particularmente da sua presidente Licínia Girão, constitui uma retaliação à postura do PÁGINA UM na denúncia de casos de evidente promiscuidade e, aí sim, de incompatibilidade com o Estatuto do Jornalismo. E um ataque agora dirigido em concreto à jornalista Elisabete Tavares, até por ser autora de uma intimação para acesso a documentos escondidos pela CCPJ. Por exemplo, em Outubro do ano passado, numa investigação do PÁGINA UM, Elisabete Tavares elencou um conjunto de casos de jornalistas em clara promiscuidade sem qualquer intervenção da CCPJ.
Jacinto Godinho (primeiro à esquerda) como moderador de um debate no Congresso dos Jornalistas. Godinho é membro do Secretariado da CCPJ que colocou obstáculos à revalidação da carteira profissional da jornalista do PÁGINA UM por ter feito moderação de um debate em 2022. O PÁGINA UM detectou também outra moderações de debates de Godinho, mas em que se assume como professor universitário.
Um dos casos é o de José Gabriel Quaresma (CP 1713), pivot da CNN, que tem uma empresa de comunicação e ‘media training’, a Sardine Conjugation Lda, criada a 29 de Fevereiro de 2023. O jornalista apresenta-se publicamente como CEO da empresa, a qual tem um capital social de apenas 250 euros, e também como um especialista em comunicação, prestando serviços de consultoria de marca, relações públicas e preparação para entrevistas.
O jornalista da CNN participa mesmo como orador em eventos de ‘estratégia de comunicação’, ao lado do ‘guru das agências de comunicação, Luís Paixão Martins, e publicita abertamente a sua actividade de consultoria em comunicação nas redes sociais, designadamente no Facebook e na rede profissional LinkedIn. Além disso, José Gabriel Quaresma refere no seu perfil no site da CNN que colabora “há 9 anos com a Academia da Força Aérea Portuguesa, enquanto Media Coach (Media Training)”.
Apesar da escandalosa promiscuidade, Quaresma mantém incólume a sua carteira profissional e continua a ser um dos rostos da TVI.
José Gabriel Quaresma (à esquerda na foto) celebrou num post na rede Facebook o aniversário da sua empresa que presta serviços de “consultadoria em comunicação, formação, media training e consultadoria online”.
Outro caso relatado pela investigação de Elisabete Tavares ‘apanhava’ as incompatibilidades de Rita Marrafa de Carvalho (CP 3195 ), uma das jornalistas mais mediáticas da RTP, que ensina a escrever “press releases”, “newsletters”, “artigos de opinião” e “crónicas” na empresa Proficoncept – Formação Profissional, Unipessoal Lda. Trata-se de uma empresa que tem como objecto social um vasto conjunto de serviços, designadamente consultoria, auditoria e formação profissional”, mas também prestação de serviços de higiene e segurança no trabalho, bem como “actividades de consultoria para negócios e gestão” e até “desinfecção, desratização e similares“. A sociedade é actualmente detida pela Ferreira da Cunha Saúde, Lda, uma empresa criada em Junho de 2020, em plena pandemia, e que “disponibiliza serviços e cuidados de saúde e bem-estar ao domicílio”.
O mais recente curso com a presença de Rita Marrafa de Carvalho, denominado ‘Estrutura da Comunicação Escrita’, custa 205 euros a cada participante, podendo render até 4.100 euros por cada edição, se houver lotação esgotada. A página que anuncia a formação inclui um vídeo promocional protagonizado por Rita Marrafa de Carvalho, completamente incompatível com o Estatuto do Jornalista, no qual afirma, designadamente, que ensina aos participantes diversas técnicas de ‘escrita’ para diferentes fins, incluindo para “apresentar um produto”. O curso, com a duração de 20 horas, vai na sua terceira edição, decorre online, via Zoom, e terá lugar em oito sessões, entre os dias 22 de Outubro e 10 de Dezembro.
Apesar da escandalosa promiscuidade, Rita Marrafa de Carvalho mantém incólume a sua carteira profissional e continua a ser um dos rostos da investigação jornalista no canal público.
A jornalista Rita Marrafa de Carvalho, da RTP, é formadora na empresa Profi Concept, onde ensina a escrever comunicados de imprensa e a saber escrever para “apresentar um produto”. Cada participante paga 205 euros, podendo a formação gerar uma receita de 4.100 euros, se tiver lotação esgotada. Este curso online vai na sua terceira edição..
Outro caso descoberto pela investigação de Elisabete Tavares para o PÁGINA UM incidiu sobre o jornalista André Carvalho Ramos (CP 6177), da CNN Portugal e da TVI, que surge como formador no Curso de Especialização em Media Training da Universidade Europeia/Grupo GCIMedia, que se realizou em Novembro do ano passado. Também é formadora neste curso a jornalista Patrícia Matos (CP 5341), da Medialivre (Now) e ex-pivot da TVI. Está prevista uma nova edição deste curso no próximo mês de Outubro e o nome de André Carvalho Ramos mantém-se na lista de formadores.
Note-se que, apesar de se realizar em instalações universitárias, este curso não tem o estatuto sequer de pós-graduação – ou seja, não concede créditos académicos (ECTS) –, sendo assim uma mera acção de formação que não confere ao formador qualquer categoria de professor universitário, algo que lhe conferiria compatibilidade de funções.
Na verdade, este curso com André Carvalho Ramos e Patrícia Matos como formadores é dirigido a gestores e executivos, sendo realizado em parceria com o GCIMEDIA Group, um grupo da área de comunicação e relações com a imprensa. Os líderes da GCI coordenam e participam como formadores no curso, como é o caso de Pedro Costa, filho do ex-primeiro-ministro António Costa. O membro da comissão política nacional do PS é o actual director-geral da GCI, onde lidera “em particular a área de comunicação institucional”. André Gerson, CEO da GCI é um dos dois coordenadores do curso e Bruno Baptista, presidente do grupo de comunicação, é outro dos formadores. Ou seja, André Carvalho Ramos e Patrícia Matos estão a exercer funções de media training, incompatível com o Estatuto do Jornalista.
André Carvalho Ramos (CNN) e Patrícia Matos (Now) são formadores num curso de Media Training da Universidade Europeia e da empresa de comunicação e consultoria Grupo GCIMedia, que tem como director-geral Pedro Costa, membro da comissão política nacional do PS e filho do ex-primeiro-ministro, António Costa. O pivot da CNN não foi incomodado pela CCPJ; ao invés, a CCPJ já ameaçou a jornalista do PÁGINA UM com um processo disciplinar.
Apesar da escandalosa promiscuidade, tanto André Carvalho Ramos como Patrícia Matos mantêm incólumes as suas carteiras profissionais. Pior: André Carvalho Ramos até apresentou uma queixa à CCPJ contra a investigação do PÁGINA UM, acolhida por este órgão disciplinador que, no mês passado, solicitou com carácter urgente um “pedido de esclarecimentos” com ameaças de abertura de processo disciplinar contra a jornalista do PÁGINA UM Elisabete Tavares.
Outros casos denunciados pela investigação de Elisabete Tavares foram os relativos a Augusto Madureira (CP 1059), jornalista da SCI, Teresa Borralheira (CP 2549), recordando-se ainda diversos casos sem qualquer actuação da CCPJ decorrentes de deliberações de Julho de 2023 da Entidade Reguladora para a Comunicação Social em que se detectavam 14 ‘jornalistas comerciais’ que elaboram trabalhos jornalísticos para cumprir contratos comerciais com empresas e entidades públicas. Neste lote de jornalistas estavam então Celso Filipe (CP 852), diretor-adjunto do Jornal de Negócios desde 2018; Miguel Midões (CP 4707), então jornalista da TSF; Luís Ribeiro (CP 3188), jornalista na Visão e comentador da SIC; Tiago Freire (CP 3053), director da Exame; Alexandra Costa (CP 2208), Rute Coelho (CP 1893), Adriana Castro (CP 7692) e Carla Aguiar (CP 739), jornalistas em periódicos da Global Media; Filipe S. Fernandes (CP 1175), jornalista no Jornal de Negócios; António Larguesa (CP 5493), jornalista no Jornal de Negócios; Mário Barros (CP 7963), jornalista colaborador no Público; e José Miguel Dentinho (CP 882), jornalista colaborador no Expresso.
Mais recentemente, o PÁGINA UM detectou um outro caso de elevada promiscuidade onde conhecidos jornalistas funcionaram não como moderadores mas sim como apresentadores de eventos ao estilo de Catarina Furtado, Manuel Luís Goucha e Cristina Ferreira, algo que o Estatuto do Jornalista impede. Em Novembro passado, o PÁGINA UM revelou que João Póvoa Marinheiro, jornalista e conhecido pivot da CNN Portugal, fora contratado no mês anterior pela agência LPM para apresentar a cerimónia dos 125 anos da Direcção-Geral da Saúde (DGS) com a presença da ministra da Saúde e ‘aparições virtuais’ do primeiro-ministro e do Presidente da República.
Jornalista e pivot da CNN Portugal foi apresentador de evento da Direcção-Geral da Saúde, depois de ser contratado pela LPM, uma agência de comunicação fundada por Luís Paixão Martins.
A entidade pública pagou à LPM mais de 77 mil euros pela organização deste evento de apenas três horas e por um vídeo de menos de dois minutos, e impôs ainda uma condição expressa no caderno de encargos: para a apresentação deveria ser contratada uma “figura pública”. João Póvoa Marinheiro predispôs-se assim a ‘mercadejar’ o seu estatuto de jornalista, disponibilizando-se a prestar serviços de ‘mestre de cerimónias’ à LPM, a conhecida agência de comunicação fundada por Luís Paixão Martins.
Na altura, a CCPJ garantiu ao PÁGINA UM que não havia nenhum registo de depósito da carteira profissional do jornalista João Póvoa Marinheiro (CP 6766), e acrescentava que “qualquer situação que possa configurar uma violação do regime de incompatibilidades” seria “devidamente investigada, o que acontecerá no caso vertente, e, se for o caso, serão desencadeados os procedimentos previstos na lei”. Mas mais de dois meses depois, e apesar da evidente incompatibilidade, João Póvoa Marinheiro mantém a sua carteira profissional incólume.
Nos últimos dias, o PÁGINA UM também descobriu que a jornalista da SIC Nelma Serpa Pinto, um dos rostos mais mediáticos da SIC – e que, curiosamente, faz um conhecido ‘par romântico’ com João Póvoa Marinheiro – também faz de ‘mestre de cerimónias’ em eventos.
Nelma Serpa Pinto faz simultaneamente apresentação de eventos (incompatível) e moderação de debates (compatível), como ocorreu numa conferência em Cascais disponível em vídeo. Ver AQUI o vídeo como host.
Os vídeos deste evento mostram, aliás, a clara distinção entre ser host e ser moderadora – e a razão fundamental e óbvia de a primeira (host) ser incompatível com a função de jornalista (Nelma Serpa Pinto chega a falar “neste nosso evento”), enquanto a segunda (moderadora) é compatível com a função de jornalista. Nelma Serpa Pinto e a CCPJ aparentemente não sabem; ou têm uma visão enviesada sobre a questão.
Na vigésima quarta sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com o professor universitário e escritor Rui Zink.
Uma das figuras mais emblemáticas e provocadoras da literatura portuguesa contemporânea, Rui Zink nasceu em Lisboa em 1961, sendo um escritor que transita entre a seriedade da análise crítica e o humor irreverente que desconstrói convenções, tanto na escrita como na forma de estar na vida.
Formado em Estudos Portugueses pela Universidade Nova de Lisboa, Rui Zink seguiu carreira académica como professor universitário, leccionando na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.
Como escritor, estreou-se em 1987 com ‘Hotel Lusitano’, mas foi com ‘Apocalipse Nau’ (1996), ‘O suplente’ (2000), ‘O Anibaleitor’ (2006) e ‘A Instalação do medo’ (2012) que consolidou a sua posição enquanto autor de relevância cultural e social, reforçada ainda mais com ‘A dádiva divina’, em 2004. A sua escrita é ágil, irónica e profundamente crítica, explorando temas que vão desde os abusos de poder e os medos contemporâneos até à banalidade do quotidiano. É um mestre em provocar o leitor, ora arrancando gargalhadas inesperadas, ora colocando-o perante inquietações existenciais.
Para além da prosa, Rui Zink aventurou-se no teatro, na banda desenhada e na literatura infantil, mostrando uma versatilidade que reflecte a sua curiosidade e criatividade insaciáveis. O humor e a inteligência, por vezes ácidas, que perpassam a sua obra fazem dele uma espécie de cronista dos absurdos e das contradições do mundo moderno.
Rui Zink fotografado no PÁGINA UM.
Nesta conversa com Pedro Almeida Vieira, Rui Zink fala na forma como a Literatura ‘venceu’ uma carreira desportiva, revisita o seu percurso ‘transgressor’, desde a sua juventude, e como tem vindo a ‘amadurecer’.
Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Rui Zink sugere o romance ‘Frei Luís de Sousa’, de Alberto Freitas da Câmara, publicado em 1935 – livro que não leu, mas que recomenda por via do protagonista – e ainda ‘A voz dos deus’, de João Aguiar, publicado em 1984.
Na vigésima terceira sessão da BIBLIOTECA DO PÁGINA UM, Pedro Almeida Vieira conversa com o professor universitário e escritor Ernesto Rodrigues.
Transmontano, nascido em Torre de Dona Chama em 1956, Ernesto Rodrigues é uma figura de destaque da literatura e da academia portuguesa, com vasta obra ensaística, experiência em edição literária e docência na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, tendo sido também director do Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias entre 2015 e 2019.
Além do ensaio, com ênfase sobretudo no mundo das letras e do jornalismo do século XIX, ao longo da sua vida acumula uma experiência no jornalismo literário, a partir dos anos 1970, mas tem sido muito através da Literatura que se tem destacado. Como ficcionista, começou com ‘Várias bulhas e algumas vítimas’ (1980), seguindo-se mais dois romances na década de 1980: ‘A flor e a morte’ (1983) e ‘A serpente de bronze’ (1989). A partir de 1994 publicou mais seis romances, dos quais se destacam ‘O romance do gramático’ (2011), ‘A Casa de Bragança’ (2013), ‘Uma bondade perfeita’ (2016, que ganhou o Prémio PEN Clube) e o mais recente Liliputine (2023). Tem também publicado poesia e dramaturgia.
Além de integrar várias antologias de poesia, é também um dos poucos tradutores literários de húngaro, fruto da sua passagem como leitor de Português em Budapeste.
Ernesto Rodrigues fotografado no PÁGINA UM.
Sobre este seu percurso, e de tudo um pouco, desde a sua infância, nesta conversa com Pedro Almeida Vieira, Ernesto Rodrigues revisita os seus passos na Literatura, abordando desde a sua infância até temas como o estudo dos folhetins nos jornais – seu tema de doutoramento –, a sua paixão pela Hungria e a sua incansável procura pelo saber. E falam de muitas mais histórias e estórias.
Entre os romances patentes na Biblioteca do PÁGINA UM, Ernesto Rodrigues recomenda os romances ‘O bobo’, de Alexandre Herculano – publicado originalmente em 1843 n’O Panorama e em 1878, já postumamente – e ‘O prato de arroz doce’, de Teixeira de Vasconcelos, publicado em livro em 1875.
Pormenor da biblioteca ‘caseira’ de Ernesto Rodrigues.
A emancipação das mulheres não é uma causa de ocasião. É um princípio essencial de justiça social e de progresso civilizacional. Durante séculos – ou mesmo milénios –, as mulheres foram relegadas para um estatuto subalterno, privadas de oportunidades, silenciadas na sua capacidade de contribuir para o desenvolvimento humano.
Essa opressão, em muitas geografias, ainda hoje se mantém, impedindo milhões de mulheres de viverem condignamente. Mas nas sociedades modernas, como a portuguesa, se é certo que ainda há obstáculos e desigualdades, também é verdade que estamos em plena transformação estrutural. O esforço, a perseverança e o talento de muitas mulheres têm conduzido a um reequilíbrio progressivo, e até justamente a tender para o seu lado – visível, por exemplo, nos rankings escolares e na crescente presença feminina no ensino superior, na Administração Pública e em diversos sectores empresariais. Prevejo que não seremos, no futuro, sociedades matriarcais, mas seremos, por certo, sociedades mais equilibradas e harmoniosas.
Licínia Girão, presidente da CCPJ.
Essa evolução, contudo, não pode ser – e seria errado se fosse – travada por um paternalismo mal disfarçado quando se avalia o desempenho das mulheres. A igualdade plena não se alcança com condescendência ou com protecção indevida. Se queremos uma sociedade justa, então temos de julgar homens e mulheres pelos mesmos critérios, sem benevolência selectiva. Se uma mulher ocupa um cargo de relevância pública e nele se revela incompetente, deve ser denunciada com o mesmo rigor e vigor que qualquer homem na mesma posição. Não há mérito na tolerância excessiva quando essa tolerância permite a mediocridade e a prevaricação.
Quando, em 2022, comecei a escrever sobre Licínia Girão, presidente da Comissão da Carteira Profissional de Jornalista (CCPJ), fi-lo com a reserva e a contenção que o estatuto do cargo impõe. Mas rapidamente se tornou evidente que essa contenção não era compatível com a gravidade dos factos. Licínia Girão não só não reunia os requisitos legais para ocupar o cargo – pois deveria ser “jurista de mérito”, e não o era –, como desde então demonstrou uma conduta inaceitável, marcada pela arbitrariedade, pelo abuso de poder e pela perseguição a jornalistas independentes.
Aceitei estoicamente os ataques que me dirigiu após as notícias que escrevi sobre a sua formação e a sua actuação apenas como presidente da CCPJ. Em resposta, fez ela, com Jacinto Godinho – o qual, apesar de ser um jornalista de mérito, revela carácter mesquinho – um parecer inédito para me criticar por um artigo em que expus a promiscuidade de um médico que acabou exonerado do Infarmed. Abriu-me ela, como líder de um Secretariado sem registos (sem actas) processos disciplinares por investigações jornalísticas legítimas, incluindo uma sobre Gouveia e Melo – numa tentativa evidente de o proteger de suspeitas de prevaricação – e outra sobre a IURD.
Jacinto Godinho, jornalista da RTP e ‘braço direito’ de Licínia Girão no Secretariado da CCPJ.
Gastou ela seis mil euros da CCPJ para me processar judicialmente. Aliou-se ao então presidente do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas, João Paulo Menezes, para tentar censurar o meu trabalho jornalístico que incidia sobre o seu percurso profissional, tema relevante jornalisticamente. Recusou ela, de forma inqualificável, pedidos de acesso a documentos da própria CCPJ, obrigando o PÁGINA UM a avançar com duas intimações em tribunal para fazer valer o direito à informação.
Agora, num último acto de vilania institucional, Licínia Girão ataca Elisabete Tavares – jornalista do PÁGINA UM e, declaro como ‘conflito de interesses’, minha companheira desde 2021 [anterior à fundação deste jornal]. A Elisabete Tavares tem um passado jornalístico (e de vida) impoluto, imaculado, de uma idoneidade a toda a prova – e não merecia, do ponto de vista pessoal, um ataque institucional ad hominem, apenas e somente por um ‘crime’ aos olhos de Licínia Girão e de quem ainda lhe admite ‘vendettas’: trabalhar no PÁGINA UM. E pior: vindo do seio do jornalismo que ela tem servido – e não ‘se servido’, como muitos – ao longo de mais de duas décadas.
Licínia Girão, que se diz jornalista, usou uma instituição ao serviço dos jornalistas para fazer algo que seria inadmissível em qualquer Estado democrático: usar o poder para abusar do poder, vingar-se de jornalistas incómodos, afrontando a liberdade de imprensa com actos que configuram crimes de prevaricação e de obstrução ao livre exercício do jornalismo.
Por tudo isto, e pesando bem as palavras, Licínia Girão é uma mulher sem qualidades. Jamais deveria ter ocupado este cargo. O seu mandato é um exemplo claro de como não deve ser exercido o poder, e a sua escolha deve ser lembrada apenas para evitar futuras repetições deste erro.
Que fique, porém, ainda registado: Licínia Girão foi cooptada por outros oito jornalistas, a saber: Jacinto Godinho, Anabela Natário, Miguel Alexandre Ganhão, Isabel Magalhães, Cláudia Maia, Paulo Ribeiro, Luís Mendonça e Pedro Pinheiro. Que também eles respondam pelo que ajudaram a criar.
Este texto teve um direito de resposta de Licínia Girão que pode ser lido AQUI.
O PÁGINA UM repudia com veemência as afirmações proferidas pela Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas (CCPJ), e particularmente do seu Secretariado, presidida por Licínia Girão, que esta tarde, ao tentar justificar um claro abuso de poder e de liberdade de imprensa no caso da (não) renovação do título da jornalista Elisabete Tavares, recorreu a um comunicado recheado de sofismas, omissões e distorções legais, que claramente demonstram má-fé, dolo e ignorância dos procedimentos administrativos de uma entidade pública. Quis, mais uma vez a CCPJ, atirar lama contra o PÁGINA UM através de mais um expediente, que por não ser o primeiro nem o segundo se desconfia não ser o último, sendo enquadráveis numa atitude de falta de transparência e de idoneidade desta entidade.
FALÁCIAS LEGAIS E INTERPRETAÇÕES ENVIESADAS
A CCPJ afirma que a revalidação de uma carteira profissional deve seguir o Estatuto do Jornalista e os regulamentos internos, como se, para o caso da jornalista Elisabete Tavares, estivesse a cumprir a lei e as normas. Não está.
No entanto, ao longo dos anos, a renovação de carteiras profissionais de jornalistas com mais de 10 anos de experiência tem sido um procedimento rotineiro e estritamente administrativo que demora poucos dias. Na verdade, administrativamente, menos tempo que a escrita de um comunicado de 29 pontos. O bloqueio arbitrário no caso de Elisabete Tavares, e a sua retirada da base de dados dos jornalistas, demonstra um desvio à prática comum, que apenas pode ser entendido como uma retaliação contra o PÁGINA UM.
Ademais, o prazo de 60 dias alegado pela CCPJ é do envio da carteira (física) profissional, para poder ser ostentada presencialmente pelo jornalista nas condições em que tal se mostra necessário; não se refere ao prazo obrigatório para a CCPJ proceder à renovação, ainda mais no regime simplificado para profissionais com mais de 10 anos de actividade. Nestes casos, sendo feito o requerimento, basta verificar que o jornalista cumpre esse requisito para uma renovação. Houve intencionalidade da CCPJ para deixar caducar a carteira profissional da jornalista Elisabete Tavares e, com esse expediente, eliminá-la da base de dados dos jornalistas.
INCOMPATIBILIDADES FABRICADAS PARA JUSTIFICAR PERSEGUIÇÃO
Alega a CCPJ que a eventual incompatibilidade de um jornalista deveria ser considerada no momento da renovação, contrariando a lei e aquilo que sempre tem sido prática. é completamente falso, e apenas justificável numa CCPJ presidida por uma falsa ‘jurista de mérito’, que haja possibilidade de “não renovação do título enquanto subsistir a incompatibilidade e durante os prazos de impedimento”. Primeiro, porque são procedimentos autónomos – a emissão e renovação está prevista na secção I do Decreto-Lei nº 70/2008 – e a suspensão e cassação na secção II. A cassação e a suspensão são processos administrativos distintos, que devem ser instaurados com os formalismos legais, algo que jamais foi feito.
Qualquer incompatibilidade que suscite dúvidas deve ser tratada em processo autónomo e separado do processo de renovação, com possibilidades de defesa até trânsito, podendo chegar ao Tribunal Administrativo. Essa análise de incompatibilidades jamais pode determinar uma suspensão da renovação da carteira e muito menos a eliminação do nome do jornalista da base de dados, que sendo pública constitui a forma de qualquer pessoa conferir se determinada pessoa é jornalista.
Além disso, a alegada e espúria incompatibilidade da jornalista Elisabete Tavares desencantada agora pela CCPJ diz respeito à moderação de um debate num congresso realizado em Março de 2022, ou seja, entre essa data e a actualidade, a CCPJ já concedeu uma renovação. O requerimento para essa renovação foi então feita em 29 de Dezembro de 2022 pela jornalista Elisabete Tavares e concedida pela CCPJ, sem qualquer pergunta, em 14 de Janeiro de 2023. Existem dúvidas sobre a má-fé da actual CCPJ?
DISPARIDADE DE TRATAMENTO E O DUALIDADE DE CRITÉRIOS
A CCPJ, ao tentar justificar a sua decisão, esquece também convenientemente que outras duas jornalistas participaram no mesmo evento que agora pretende usar contra Elisabete Tavares. Nem Teresa Silveira (do jornal Público) nem Isabel Martins (da revista Mundo Rural) tiveram, entretanto, qualquer problema com a renovação das suas carteiras. Além disso, esquece convenientemente, que em anteriores mandatos, houve jornalistas que solicitaram esclarecimentos sobre se a moderação de congressos caía nas incompatibilidades do Estatuto do Jornalismo, mesmo sendo claro que não. E a resposta da CCPJ foi que não existiam incompatibilidades? O que justifica esta dualidade de critérios? Será necessário fazer a lista das centenas de jornalistas que moderaram debates em congressos? Ou estamos apenas perante uma descarada acção para só atingir o PÁGINA UM e os seus jornalistas.
MENTIRAS SOBRE O ESTATUTO DOS JORNALISTAS EM SITUAÇÃO DE RENOVAÇÃO
A CCPJ tenta desvalorizar a gravidade do impedimento administrativo de Elisabete Tavares, com base em fundamentos ilegais, afirmando que o facto de o seu nome desaparecer da base de dados é um mero efeito técnico. No entanto, sabe-se que a ausência de nome na base de dados pode ser utilizada para criar entraves legais e administrativos ao exercício da profissão, ou mesmo fazer acusações na praça pública, algo que o PÁGINA UM não pode permitir. No ponto 28 do seu comunicado, a CCPJ tem o descaramento de confessar que este ‘desaparecimento’ causa “constrangimentos”, mas pouco se importa que tal situação suceda única e exclusivamente por sua responsabilidade. E ainda se faz de ingénua quando afirma que pode emitir “um documento comprovativo de que o pedido foi efectuado dentro do prazo e está em análise”. Então, e qual a razão para não ser feito por regra? Não há dinheiro para isso, mas há 6.000 euros para pagamento de serviços jurídicos para processar o director do PÁGINA UM?
PERSEGUIÇÃO RECORRENTE E O USO DE DINHEIRO PÚBLICO PARA FINALIDADES QUESTIONÁVEIS
Não é a primeira vez que a CCPJ, sob a liderança de Licínia Girão, adopta expedientes administrativos duvidosos para atacar o PÁGINA UM, abrindo-me até processos disciplinares sobre investigações jornalísticas em curso e fazendo mesmo queixa no Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas com recurso a expedientes pidescos. Vale lembrar sempre que Licínia Girão, que preside a uma entidade que constitui o ponto focal da lei anti-SLAPP, decidiu gastar 6.000 euros em serviços jurídicos para processar-me pessoalmente, numa acção que acabou por ser abandonada devido à pressão de vários membros. Além disso, Licínia Girão até esconde a acta do Plenário da CCPJ onde tal questão foi debatida, o que me obrigou a uma intimação, em curso, no Tribunal Administrativo de Lisboa. O uso de dinheiro público para perseguição política e pessoal é inaceitável e tem de ser devidamente investigado.
RESISTÊNCIA E TRANSPARÊNCIA
O PÁGINA UM não cederá a tácticas intimidatórias e de vitimização da CCPJ, que usa de poderes públicos e administrativos para atacar um projecto jornalístico independente, que tem incomodado os poderes e, em grande parte, também as promiscuidades na imprensa e no jornalismo. Com este caso da renovação do título da jornalista Elisabete Tavares, com um passado e um presente irrepreensíveis do ponto de vista ético e deontológico, e uma vasta e reconhecida experiência profissional, a CCPJ deseja tão-só arrastar o PÁGINA UM para o chavascal que se tem tornado o jornalismo português, para que assim não possamos manter publicamente a imagem imaculada.
Posto isto, a CCPJ pode continuar a recorrer a expedientes mesquinhos, a comunicados inqualificáveis, mas não conseguirá abalar a nossa determinação na defesa da liberdade de imprensa. E mais: agiremos judicialmente se a renovação não for diligenciada num prazo curto ou se não for enviado comprovativo para o exercício da profissão com a imediata recolação do nome da Elisabete Tavares na base de dados dos jornalistas.
De resto, houve em tempos alguém que defendeu que, aprestando-se o fim do exercício de um cargo, se deveria permitir que o incumbente terminasse o mandato com dignidade. No caso de Licínia Girão, a haver dignidade, então recorro ao nosso ‘cronista’ Brás Cubas: deveriam aplicar, de forma metafórica, a esta senhora um estímulo locomotor à maneira espartana.
Uma nota final: apesar da CCPJ afirmar que nenhuma sanção se aplica a um jornal por admitir ou manter ao seu serviço um jornalista que esteja a aguardar decisão para renovação, o PÁGINA UM não publicará qualquer artigo noticioso da jornalista Elisabete Tavares enquanto a CCPJ mantiver abusiva e ilegalmente a decisão de não revalidar o seu título profissional. Aceitar que a CCPJ prolongue uma decisão é estar a aceitar um acto de abuso de poder e ‘legitimar’ atentados à liberdade de imprensa. Os membros da CCPJ – que, aliás, são jornalistas de profissão – não são os donos dos jornalistas nem estes lhes têm de prestar vassalagem.
O PÁGINA UM nunca fez concessões. Nunca cedeu à promiscuidade que contamina os media tradicionais e compromete a independência jornalística. Na verdade, desde a sua fundação, tem denunciado os abusos, a falta de transparência e a parcialidade de instituições que deveriam zelar pelo rigor da profissão.
Revelámos jornalistas ‘comerciais’, que apresentavam eventos promocionais, que tinham empresas de comunicação, que fazia media training, que exerciam sem título profissional. Revelámos também a ‘mercantilização’ do jornalismo por empresas de media, através de parcerias comerciais que colocavam em causa a independência editorial, e mesmo ingerências inaceitáveis. Fomos também o primeiro jornal a falar abertamente da crise financeira dos media portugueses (Global Media e Trust in News, por exemplo) e de como minava a credibilidade da imprensa. Fizemo-lo sempre com consciência do nosso dever e respeito pelas normas deontológicas.
Mas esta integridade tem um custo, sobretudo dentro da classe. Por exemplo, a Comissão da Carteira Profissional de Jornalistas (CCPJ), uma entidade pública mas representada apenas por jornalistas, sob a liderança de Licínia Girão, tem demonstrado uma obsessão persecutória em relação ao PÁGINA UM, sobretudo a partir do momento em que exigimos informação e criticámos a sua acção, chegando a recorrer a expedientes administrativos questionáveis para dificultar a nossa actividade. A mais recente prova desta actuação é o caso da jornalista Elisabete Tavares, que constitui uma das ‘colunas’ do PÁGINA UM, cuja revalidação da carteira profissional foi agora arbitrariamente bloqueada pela CCPJ.
A pretexto (explícito) de uma moderação realizada num congresso sobre mercados agrícolas no longínquo ano de 2022, uma função que nunca foi considerada incompatível com o exercício do jornalismo, a CCPJ decidiu, a dois dias da expiração do prazo da carteira, levantar uma questiúncila que, a existir em hipótese meramente académica, deveria ter sido tratada em processo autónomo. Ou seja, uma hipotética incompatibilidade que pode levar à cassação da carteira profissional jamais pode ser feita em sede de revalidação, mas sim através de um procedimento autónomo, como está a ser feito. O prazo de validação da carteira que, em profissionais com mais de 10 anos, demora menos de duas semanas, só poderia ser cumprido por ser um mero acto administrativo. Mas no ‘mandato’ de Licínia Girão as leis são coisas abstractas.
A consequência deste absolutamente ridículo ‘não-caso’ foi a caducidade do registo profissional de Elisabete Tavares. Ontem, dia 31 de Janeiro era o último dia de vigência do antigo título, e o nome da Elisabete Tavares estava na base de dados da CCPJ. Hoje, dia 1 de Fevereiro, num sábado, o nome da Elisabete Tavares deixou de constar na base de dados de jornalistas, colocando-a numa situação de irregularidade e criando um constrangimento operacional ao PÁGINA UM. Vejam a celeridade.
Note-se, aliás, que estar a CCPJ a suscitar a eventual incompatibilidade da Elisabete Tavares por exercer a função jornalística de moderadora num congresso não é apenas absurdo – até face às promiscuidades reinantes na imprensa -, é estúpido. E isto porque, nesse mesmo congresso, estiveram também presentes, como moderadoras de debates, outras duas jornalistas: Teresa Silveira, do jornal Público, e Isabel Martins, directora da revista Mundo Rural. Ambas continuam, em 2025, justamente com a carteira profissional activa.
Esta decisão, tomada sem precedentes conhecidos, levanta sérias dúvidas sobre a isenção e os critérios da CCPJ. A mesma entidade que nunca levantou problemas em relação a figuras como Francisco Pinto Balsemão, que manteve a carteira profissional apesar de funções empresariais incompatíveis, ou a jornalistas que exerceram actividades paralelas sem questionamento, opta agora por aplicar um duplo critério para atingir o PÁGINA UM.
A perseguição não é nova. E desconfia-se que não terminará se não lhe puserem cobro por força da lei. A CCPJ já recorreu a processos disciplinares contra mim e pareceres dúbios para tentar descredibilizar este jornal. A própria Licínia Girão gastou mesmo 6.000 euros da CCPJ em serviços jurídicos para me processar, porque não apreciei notícias verdadeiras. Teve de desistir do processo por pressão dos seus colegas, mas o gasto foi assumido ilegitimamente pela CCPJ. Em tudo, o objectivo é evidente: criar dificuldades, desacreditar e condicionar a nossa actuação. Mas se a estratégia passa pela intimidação, a resposta será a mesma de sempre: resistência e transparência.
Este caso, porém, ultrapassa as marcas, por ser uma descarada tentativa de nos puxar para o seu ‘chiqueiro’. A CCPJ quer, por certo, que o PÁGINA UM tenha notícias de uma jornalista sem carteira profissional válida – mesmo se por uma estrategia ínvia e maldosa -, de modo a que possa apontar-nos ‘telhados de vidro’ e, no limite, poder até aplicar-nos uma coima, porque aquilo que a outros é permitido, ao PÁGINA UM seria penzalizado. Não sou ingénuo a esse ponto.
Por isso, já solicitámos intervenção jurídica para exigir a imediata revalidação da carteira profissional de Elisabete Tavares e eventualmente apresentar queixa por abuso de poder e atentado à liberdade de imprensa. Enquanto esta situação persistir, e porque o Estatuto do Jornalista não permite,e é uma lei, o PÁGINA UM fica impedido de publicar artigos e trabalhos jornalísticos da jornalista Elisabete Tavares, condicionando assim a edição do jornal. Podíamos ignorar esta sacanice da CCPJ, mas isso seria um ‘convite’ a que pudessem fazer mais e acusarem-nos, usando até outra imprensa, de estarmos a ser incoerentes, usando uma jornalista sem carteira válida, independentemente da forma como tal sucedeu.
Assim, diariamente, e em substituição de uma eventual notícia que seria publicada pela Elisabete Tavares publicaremos uma manchete negra em protesto contra esta afronta à liberdade de imprensa. Até porque não se trata apenas de um caso isolado, mas de um sinal preocupante do estado da regulação jornalística em Portugal. Pedimos, assim, a compreensão dos nossos leitores para eventuais constrangimentos na edição do PÁGINA UM, dado que somos apenas dois jornalistas a tempo inteiro, agora reduzidos a um. Esperamos também a solidariedade.
E há um aviso: a CCPJ, e a sua ainda presidente, Licínia Girão, pode continuar a recorrer a torpes e mesquinhos subterfúgios administrativos, mas não conseguirá desviar-nos do nosso compromisso com um jornalismo independente. E se continuar, terá de ser responsabilizada pelos seus actos. O PÁGINA UM continuará a denunciar estas práticas e a expor os mecanismos que tentam condicionar a imprensa livre. É por isso que nascemos. E é isso que continuaremos a fazer.