Autor: Nuno André

  • Língua: as palavras perigosas

    Língua: as palavras perigosas

    O relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Apresentamos uma série de 10 depoimentos sobre a sua vivência.

    Neste sétimo depoimento, Nuno André exemplifica, com o seu caso pessoal, como uma única palavra – calma – pode afinal desencadear um efeito oposto se, por engano, for dita em russo e não em ucraniano.

    Continuamos a publicar os episódios desta série de depoimentos intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Viagens: um estranho caldo de perigos e normalidade

    Viagens: um estranho caldo de perigos e normalidade

    O relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Apresentamos uma série de 10 depoimentos sobre a sua vivência.

    Neste sexto depoimento, Nuno André fala-nos da sua experiência durante as suas “incursões” por território ucraniano, até Lviv, onde o controlo militar é intenso e os perigos espreitam. Mas também relata a aparente normalidade da principal cidade do oeste da Ucrânia.

    Continuaremos amanhã a publicar os episódios seguintes desta série de depoimentos intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Estranha fartura: os donativos da solidariedade europeia

    Estranha fartura: os donativos da solidariedade europeia

    O relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Apresentamos uma série de 10 depoimentos sobre a sua vivência.

    Neste quinto depoimento, Nuno André fala-nos da logística dos donativos que vão chegando de todos os pontos da Europa, que paradoxalmente concedem uma ideia de fartura para o apoio aos refugiados da Ucrânia, mas que pode, a prazo, dar a sensação de não ser necessário mais ajudas.

    Continuaremos amanhã a publicar os episódios seguintes desta série de depoimentos intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Refugiados: como chegam e como partem

    Refugiados: como chegam e como partem

    O relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Apresentamos uma série de 10 depoimentos sobre a sua vivência.

    Neste quarto depoimento, Nuno André fala-nos da chegada dos refugiados e como funciona a gestão com vista ao seu reencaminhamento para outros países, incluindo Portugal. E aborda também o estado de saúde dos refugiados, incluindo o risco de infecção por covid-19 e outras doenças.

    Amanhã publicaremos mais episódios desta série de depoimentos intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Crianças: as vítimas inocentes e as brincadeiras num centro comercial

    Crianças: as vítimas inocentes e as brincadeiras num centro comercial

    O relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Apresentamos uma série de 10 depoimentos sobre a sua vivência.

    Neste terceiro depoimento, Nuno André fala-nos das crianças que chegam ao centro de refugiados instalados num centro comercial em Przemyśl na rota dos refugiados que saíram da Ucrânia a partir da região de Lviv.

    Publicaremos ainda hoje o quarto episódio desta série de depoimentos intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Mantimentos: da escassez à (provisória) fartura

    Mantimentos: da escassez à (provisória) fartura

    O segundo relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Este depoimento integra uma série de 10 sobre a sua vivência.

    Neste segundo depoimento, Nuno André fala-nos da chegada dos mantimentos até à principal fronteira polaco-ucraniana e a organização possível dos víveres, com algum caos à mistura e também com “esquemas alternativos”.

    Publicaremos amanhã mais depoimentos desta série intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Refugiados: uma vida que cabe numa mala

    Refugiados: uma vida que cabe numa mala

    O relato de Nuno André, jornalista do PÁGINA UM, que se encontra na Ucrânia e na Polónia, sobretudo a fazer trabalho humanitário no centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, com incursões até Lviv. Apresentamos uma série de 10 depoimentos sobre a sua vivência.

    Neste primeiro depoimento, Nuno André fala-nos das primeiras fases do acolhimento dos refugiados, das crianças e das mulheres que chegam sozinhas, da chegada e partida de quem vem ajudar, da organização dos centros e dos anseios daqueles que trazem a vida numa mala. E responde sobre se Portugal é ou não apetecível como destino dos que fogem à invasão russa.

    Publicaremos ainda hoje o segundo episódio desta série de depoimentos intitulada “A terra da guerra”.

    Edição: Bernardo Almeida


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  • Não sei ainda dizer qual o sabor da morte

    Não sei ainda dizer qual o sabor da morte

    Cometo, neste texto, um pecado capital. Como jornalista, não soube distanciar-me do objeto da notícia. Estou, em simultâneo, a fazer trabalho humanitário. Envolvi-me demasiado para estar agora a escrever notícias “objectivas”.


    Antes de partir, sentei-me no sofá, desliguei a televisão, pedi inspiração para um pequeno texto para publicar nas redes sociais. Ocorreu-me uma pergunta: a que saberá a morte?

    Sem resposta, comecei a arrumar a mala: duas camisolas, um casaco, dois pares de calças, dois pares de meias, um par de botas e um gorro, e outras coisas habituais e íntimas para um viajante. Bagageira e lugares preenchidos com mantimentos: além de alimentos, medicamentos e material de socorrismo, material logístico.

    A família, os amigos e os conhecidos rapidamente espalharam a novidade.

    Um dia depois, chegaram os primeiros donativos. A esposa, as amigas dela, os meus amigos ajudaram a separar e embalar os produtos. No dia seguinte já não tinha lugar em casa, nem na garagem, nem no jardim.

    Entretanto, não escrevi o texto. Apenas tive tempo para avisar os meus alunos e colegas que não daria as próximas aulas. Avisar o Pedro que, afinal, não tivera oportunidade de escrever o texto sobre as guerras que continuaram a pulular pelo Mundo nos últimos dois anos sem terem capacidade de “estancar” a pandemia.

    Em Lviv, a carrinha com mantimentos que me transportou desde Portugal.

    Parti. Julgava seguir sozinho, mas afinal saí na companhia de dois recém conhecidos, Mykola e Nazar. O primeiro ofereceu-se para ser tradutor, porque desejava buscar três familiares. O segundo queria boleia para se alistar no exército e combater russos.

    Percorremos em dois dias e meio a Europa. Espanha, França, Alemanha. Polónia, finalmente. Chegámos à vizinhança da Ucrânia. Fomos abordados pela polícia uma única vez, na fronteira francesa. Na Alemanha começámos a ver carros carregados, e algumas bandeiras ucranianas. Na Polónia, caravanas já organizadas.

    Mykola Sydor e Nazar Khamulyak, portugueses de ascendência ucraniana, que me acompanham.

    Na fronteira Polónia-Ucrânia não vimos sinais de covid-19, mesmo se, antes da invasão russa, aquele país estava ainda sob um surto, com 1,5% da sua população considerada infectada, apenas 35% vacinada.

    Aliás, se houver covid-19 por aqui, anda desmascarada! Não há máscaras em lado algum, nem certificados. Não há gente isolada nem de quarentena. Não há sintomas gripais nem gente doente.

    Há “apenas” guerra, e desde que há guerra não há máscaras – gente destemida. Dizem-me que por aí, em Portugal, há muita gente temida pela possibilidade de a chegada de ucranianos fazer ressurgir a pandemia. Quer-se vacinar tudo e todos.

    Centro de acolhimento de refugiados em Przemyśl, na fronteira polaca.

    Pelo caminho, Mykola conseguira resgatar a família sem se encontrar com ela. O “guerrilheiro” Nazar ficou tão absorvido pela multidão que encontrou que esta lhe sugou as forças com pedidos de ajuda. Trocou a frente de fogo pelas chamas do humanismo.

    Valeu-lhes, e valeu-me, o facto de serem portugueses de origem ucraniana; dominam as duas línguas na perfeição.

    Durante os primeiros dias foram-nos chegando camiões carregados. As ofertas vindas de Portugal eram rapidamente guardadas em armazéns improvisados. Na fronteira, uma correria de camionetas e de carros, num vaivém. Gratuitamente, levam os refugiados de uma fronteira para a outra. No meio do caos, alguma ordem.

    Há vida nos carregadores.

    Do lado da Ucrânia, filas de quarenta quilómetros de espera, para passar. Maridos que vêem partir a mulher e os filhos, mulheres e crianças assustadas.

    Somente as crianças aparentam felicidade. Há internet gratuita e fichas para carregar os telefones. Para muitos, isso é a ligação aos familiares, à vida. Há vida assim.

    Poucos quilómetros depois da fronteira, nas entranhas da Ucrânia, encontramos uma rotina diferente. Lviv é, apesar de tudo, uma cidade onde reina a normalidade. O comércio funciona, as pessoas circulam, vão para o trabalho, às compras, passeiam. Uma rotina.

    Mas essas são os habitantes. Para quem chega de outras cidades, como Kiev, fugindo mesmo da guerra, e pernoita em escolas e armazéns, aguarda-se apenas com ânsias a oportunidade de seguir para a fronteira.

    As estradas ucranianas na região oeste estão fortemente ocupadas por militares em postos de controlo de poucos em poucos quilómetros. Militares que não falam inglês, de pouca simpatia, mesmo para quem vem fazer serviço humanitário. São necessários alguns minutos até que nos olhem com outros olhos. Qualquer um de nós pode ser um infiltrado…

    Vídeos e fotografias são proibidos. Revistam tudo. Fazem um excelente trabalho.

    Um dos postos de controlo, anteontem à noite, no coração da Ucrânia.

    Ao distribuir alguns mantimentos pelas escolas, conforme as necessidades de cada uma, fui recebendo outros pedidos, outras moradas. Gente para transportar. Cada uma mais perto de Kiev, cada vez com maior presença militar. Até agora, estão em falta super-guerrilheiras, modelos de perfeição, que nos chegam a Portugal pelas redes sociais.

    Há gasóleo nas bombas, há gente que mantém rotinas. Em falta, mais ajuda humanitária. Mais meios, mais mãos para ajudar.

    Depois de ganhar confiança com a população local, levam-nos aos seus pontos de encontro. Um deles é uma biblioteca transformada em fábrica de construção de redes para camuflar tanques. Ali, jovens, crianças e adultos cortam panos e vestem as redes, ao som de piano, guitarra. E cantos. Nunca vi biblioteca com tantos jovens. Há destes momentos deliciosos em tempos difíceis, onde se encontra a Humanidade.

    Biblioteca em Lviv, onde se lê, canta e se costuram camuflados para tanques ucranianos.

    Sabendo que me aproximo de Lviv, pedem-me para levar mantimentos, fazem-me entregas, abraçam-me. Por instantes esqueço os quatro graus negativos.

    Recordo a minha família.

    No Lviv International Media Center encontram-se os jornalistas que requisitam as credenciais, como eu, para o PÁGINA UM. Internet, computadores, casa de banho e bebidas quentes. Um luxo nestas paragens, e nestes tempos.

    Para muitos enviados especiais, um lugar fantástico para apresentar directos, para copiar ou reescrever as notícias das agências internacionais. Estou grato a este centro, permitiu-me internet gratuita por instantes.

    No centro de imprensa de Lviv.

    Entretanto, um mea culpa.

    Cometo, neste texto, um pecado capital. Como jornalista, não soube distanciar-me do objeto da notícia. Estou, em simultâneo, a fazer trabalho humanitário. Envolvi-me demasiado para estar agora a escrever notícias “objectivas”.

    E também não sei ainda dizer qual o sabor da morte. Mas sei dizer-vos que a vida é deliciosa. Mesmo aqui, na Ucrânia.