Autor: Bernardo Almeida

  • Big Trouble in Little China: de flop a clássico

    Big Trouble in Little China: de flop a clássico


    Passaram já 37 anos do lançamento de um filme que hoje pertence a qualquer lista de filmes de culto que se preze. Trata-se de Big Trouble in Little China, que em português adoptou o título Jack Burton nas Garras do Mandarim.

    Estreado nos cinemas americanos em 2 de julho de 1986 este filme do realizador John Carpenter marcava a sua quarta colaboração com o actor Kurt Russell.

    Depois de filmes como Elvis, The Thing e o também clássico filme de culto Escape from New York, Carpenter voltaria a apostar em Russell, muito embora num registo completamente diferente dos filmes anteriores.

    Filmado em São Francisco, Big Trouble in Little China conta a história de um camionista que é transportado para um conflito tribal no submundo de Chinatown, depois do rapto da namorada de um amigo.

    É este primeiro momento que serve de base para o chorrilho de Kung Fu, pancadaria, personagens misteriosas e outras mais patéticas que, com os efeitos especiais à mistura, fazem com que este filme possa ser visto e revisto vezes sem conta.

    Big Trouble in Little China é, na verdade, uma comédia de acção, mas também uma paródia dos filmes mais sérios do género, sobretudo dos da década de 80. O papel de Jack Burton (Kurt Russell) está tão bem representado que quase faz esquecer a crítica que esta personagem encerra.

    Porém, Jack Burton encerra, de igual modo, uma crítica em forma de comédia, feita a actores como Chuck Norris, ou mesmo Van Damme. Todos estes protagonistas tinham uma coisa em comum: representavam o triunfo do individuo mais forte e mais capaz que através dos seus talentos e competências matam os maus, ficam com o prémio (normalmente a coprotagonista) e são por isso uma forma de role-model que o “americanismo” e os valores ocidentais tanto regurgitam nos seus filmes, sobretudo os de acção.

    Burton é um perfeito idiota que consegue prosseguir vivo no filme, ora por sorte, ora por auxílio constante. São muitas as cenas em que isso acontece. Se as lutas com os “maus” são indicativas disso, Burton perde quase todas essas batalhas e até a personagem de Kim Catrall, que, por exemplo, com um soco consegue incapacitar um monstro. A suposta fuga liderada por Burton leva o grupo de volta a um exército de inimigos em que é o aparente ajudante de Burton, Wang Chi, interpretado por Dennis Dun, que imobiliza tudo e todos.E a paródia sob o herói caucasiano ainda é mais transparente quando Burton se levanta pronto a lutar e todos os inimigos estão derrotados.

    Mais dúvidas houvesse sobre a paródia que é feita às convenções do género de acção, relembro outras duas cenas que marcam a crítica de Carpenter: Burton não sabe usar armas de fogo. A arma (e o seu manuseio) é um componente do cinema americano que remonta ao poder masculino dos filmes de Western. Neste filme, Burton pega numa metralhadora e acerta no tecto onde, quase como um desenho animado, é atingido pelos destroços causados pelos seus tiros falhados. Finalmente e já no fim do filme, Burton (que praticamente não tem arco de desenvolvimento) volta para o seu camião sozinho e Gracie Law (Kim Catrall) não só não vai com ele como o normal beijo de fim de filme não acontece.

    Por tudo isto, a interpretação de Russell é enorme. De relembrar que Russell tinha já como papel indexado a personagem de Snake Plissken no filme Escape from New York (e a sua sequela posterior), este sim um papel de acção dentro das convenções do cinema de acção americano. É por isso que Jack Burton é revelador das capacidades artísticas deste actor já que é o inverso de tudo o que é esperado num protagonista do género.

    Mas há outros aspectos deliciosos de Big Trouble in Little China a considerar. Antes de mais, as outras personagens. Law é também um exagero da mulher protagonista e suas linhas de diálogo como as expressões faciais e corporais de Kim Catrall são sublimes nesse exagero. E mesmo o pequeno papel de Kate Morgan, como a jornalista Margo, confere mais uma caricatura da ansiedade de um furo jornalístico.

    Lo Pan, protagonizado pelo mais-que-veterano James Hong, é simplesmente genial, um vilão hilariante e implacável. É impressionante a complexidade desta personagem, desde que é um velho numa cadeira de rodas com uma fragilidade enorme, mas uma voz ameaçadora, que de repente é um mestre do mal com poderes espectaculares. Não menos fantástico é Egg Shen, o feiticeiro de pequena estatura, mas também ele detentor de poderes super-humanos.

    Claro, não se pode esquecer das “Three Storms”, vilões que, embora lacaios do vilão supremo, conferem à mitologia deste filme uma espectacularidade extra, devidos às suas capacidades e aos efeitos especiais que, nos anos 80 são, essenciais neste filme e trazem uma dimensão de quase invencibilidade a Thunder, Rain e Lightening.

    Para além dos efeitos especiais, temos a destacar os cenários e, claro, as lutas. Sobretudo na primeira parte do filme, todas as lutas são incríveis pela quantidade de envolvidos e pelas coreografias, com actores que mais tarde aparecem em inúmeros filmes de artes marciais.

    Os neons da caveira atrás da descida triunfal de Lo Pan, bem como todo o cenário, as lutas no ar e já perto do fim o palácio onde Burton consegue finalmente assumir algum heroísmo ao enfiar uma faca impossível na cara de Lo Pan, aprofundam o filme, mas também servem para criar o exagero cómico que é a tonalidade dominante de Big Trouble in Little China.

    Numa dimensão mais cultural, este filme é, como descrito acima, uma crítica ao herói caucasiano, mas assim é pela forma como a sociedade americana via a cultura asiática. Se os filmes de artes marciais eram já uma constante, primeiramente com o Bruce Lee e mais tarde com Chuck Norris e Van Damme, já a feitiçaria, os poderes sobre-humanos ilustram a forma como a arte marcial era perspectivada pelo Ocidente que queria “comprar” a fantasia e o spaguetti da violência do cinema asiático.

    Ainda assim, Carpenter não deixa de defender o triunfo americano, uma vez que Burton é efectivamente o ajudante, e não protagonista; é ele que emite o golpe final contra o vilão supremo, apesar das inconsistências, e assim se sobrepõe àquele que devia ser o duelo final: Wang versus Lo Pan. Curioso que até neste pormenor as convenções são parodiadas.

    Apesar de todos estes ingredientes Big Trouble in Little China foi então um flop total no cinema, e nem sequer atingiu o break even, tendo custado mais de 25 milhões de dólares a ser produzido e ter feito menos 24 milhões de receita.

    Tendo sido lançado no mesmo ano que Top Gun, este um filme de acção sem paródia, Big Trouble in Little China é um filme incompreendido na altura em que saiu. Por um lado, a comédia de Russell, com laivos de John Wayne mimetizado nos constantes one liners que ficaram na memória, não foi bem recebida porque a audiência não percebeu a crítica e não se identificou com a personagem.

    Por outro lado, e à semelhança, de Green Hornet, com Bruce Lee, o verdadeiro protagonista que é o lutador asiático, não conseguiu produzir o efeito de herói principal e é remetido para sidekick. Desse modo, a paródia em Big Trouble in Little China seria mais bem entendida se fosse feita nos dias de hoje, uma vez que estas nuances ainda não eram então reconhecidas. Talvez por isso haja rumores de um remake com Dwayne Johnson no papel que pertenceu a Kurt Russell.

    Em conclusão, neste filme ficam sobretudo as frases emblemáticas, a pancadaria, o gesto de mão triunfal (só quem viu é que sabe o significado) e o élan das personagens, e que transformaram Big Trouble in Little China, um flop de cinema, agora num filme de culto.

  • Blade Runner: a genialidade já tem quatro décadas

    Blade Runner: a genialidade já tem quatro décadas


    Lançado a 25 de Junho de 1982, mas estreado em Portugal apenas em Fevereiro de 1983, Blade Runner é considerado um dos melhores filmes de ficção científica de sempre. Baseado na obra do escritor americano Philip K. Dick, “Do Androids Dream of Electric Sheep?”, publicado em 1968, o filme foi realizado por Ridley Scott, e tem como protagonistas Harrison Ford, Rutger Hauer, Sean Young e Daryl Hannah.

    A história, pelo menos à superfície não parece muito complexa. Num futuro próximo, em 2019, que na verdade agora já passou, a Tyrell Corporation constrói uns androides (denominados de Replicants), Os Nexus 6, para trabalharem como escravos e substituírem os humanos em todos os empreendimentos espaciais, nomeadamente nas colónias.

    Quando um grupo de replicants mais avançados forma uma rebelião e matam várias pessoas para retornarem ao planeta Terra, é chamado um ex-polícia, que tem por nome de código Blade Runner, agora na reforma, para os encontrar e eliminar.

    Aquilo que torna Blade Runner num filme intemporal é um conjunto de temas e estéticas.

    Primeiro, Blade Runner apresenta uma visão do século XXI como uma distopia onde as corporações estão no topo das pirâmides decisionais e literais, conforme se vê logo no princípio do filme.

    Esta distopia combinada com a ideia de inteligência artificial, a estética de pobreza combinada com a tecnologia, patente nas ruas da cidade de Los Angeles, conferem o elemento cyberpunk que muitos consideram ter tido início precisamente neste filme, o que o torna num arquétipo.

    Por outro lado, temos os elementos de film noir, que trazem mais uma dimensão a este filme uma vez que em 1982 o género de ficção científica era parco no que toca à estética e temáticas desse género. Deckard (Harrison Ford) é uma espécie de detective com ambiguidades morais, alcoólico que acaba por salvar Rachael (Sean Young), uma replicant que assume o papel de femme fatale, com as convenções típicas de Noir, cigarro, discurso e pose agressiva, baton e roupas escuras.

    Finalmente a decadência urbana, a noite, e o chiaroscuro, a convenção cénica mais conhecida da estética Noir. Na cena onde Deckard avança na sua ambiguidade e beija Rachael, (que apesar de femme fatale é um robot), a luz e a sombra vinda das persianas são postas sob a cara do actor que expressa a prisão moral onde a personagem se encontra ao sucumbir ao desejo.

    Ainda é de destacar o Bradbury Building como local de filmagem de Blade Runner, mas que é uma homenagem a um dos mais icónicos e clássicos de Noir, Double Indemnity.

    Mas Blade Runner apresenta ainda temas como os opostos raciais e sociais. O multiculturalismo é anexado à pobreza das ruas onde se veem várias raças e a azáfama constante. No topo dos edifícios (a pirâmide simbólica) apenas existem caucasianos, vê-se o pôr do sol e não se ouve barulhos citadinos.

    Outro tema e outra dualidade são os arcos desenvolvidos por Deckard e Batty (Rutger Hauer) ao longo do filme. O ponto de partida de Batty é o desejo de viver e o de Deckard o trabalho de eliminar. Este segue as ordens dos seus superiores e embora os replicants tenham uma vida curta de modo a não poderem desenvolver empatia, é Deckard que parece mais maquinal e implacável na sua missão imposta pela hierarquia. Desse modo, há como que um paradoxo entre o robot que quer ser livre e viver e a frieza laboral do suposto humano que os persegue, e por isso a inversão dos carácteres das personagens.

    É certo que este paradoxo é um ponto de partida que se flexibiliza ao longo do filme, pelo remorso de Deckard após eliminar uma mulher replicant e o peso dessa mágoa que no fim o faz salvar Rachael, a robot fatale.

    Batty começa num registo mais emocional à procura de uma forma de prolongar a sua vida e a dos seus, como uma espécie de protector da sua classe. No entanto, ao perceber que isso não é possível, vinga-se e mata o seu criador, Tyrell e de uma forma visceral, contrapondo a sua construção em que é supostamente um autómato. É mais tarde, antes da sua morte que Batty se redime ao salvar Deckard da sua morte. Batty entende que a vida e a empatia são os valores mais importantes e assim transmuta-se de robot para humano.

    Estas personagens, que se vão transformando ao longo do filme, encerram uma questão filosófica à volta do que é ser um humano e de que é feita a natureza humana. Se existe um pré-determinismo ou se são as nossas escolhas que nos fazem quem nós somos e somos livres para escolher.

    Nesse sentido este tema recai no Existencialismo e Pós-modernismo como pano de fundo já que as personagens principais parecem condenadas a uma consequência, mas como indivíduos escolhem o seu próprio caminho negando as grandes narrativas que lhes são impostas. Os superiores/ criadores que as impõem assumem o papel do discurso dominante veiculado para uma sociedade autoritária que quer tornar o indivíduo numa ferramenta, a que este se rebela.

    O assassinato de Tyrell tem ainda outra conotação tanto religiosa como “Nietzchiana”. Se este é o criador e Batty o criado, a morte de Tyrell simboliza a morte de Deus ainda que num ser imperfeito. A morte do Pai é a ascensão do filho, mas é também a ideia do ubermensch, o super-homem de Nietzsche, já que enquanto estão vivos, os replicants são uma forma melhorada do ser humano por serem mais rápidos, mais fortes e mais capazes, que desejam a liberdade acima das restrições morais.

    O tema da religião reaparece na mão de Batty, quando é pregada, e assim assume a posição de um Jesus (ainda que androide) que morre pelos seus e mostra aos humanos a transfiguração do robot em algo mais.

    Apesar de todos estes temas e estéticas, Blade Runner não teve nem o sucesso nem a importância que hoje lhe é indiscutível. Custou 28 milhões de dólares e teve um retorno à escala mundial de apenas 41 milhões. Foi mais tarde que lhe seria conferido o estatuto de filme de culto, já na fase do DVD. Ainda assim este filme tem algumas versões posteriores ao seu primeiro lançamento.

    É hoje mais consensual que a versão 2007 Director’s Cut é aquela onde o realizador Ridley Scott tem mais liberdade para a sua edição e é por isso aquela que é considerada a melhor versão.

    Seja que versão se veja o que é importante para qualquer amante do género, o melhor é ir ver se ainda não viu, ou então rever esta obra-prima num mundo cinéfilo cheio de primas de obra.

    Blade Runner é sem dúvida um filme à frente do seu tempo e influenciou grandes êxitos do género da ficção científica como por exemplo Matrix ou Quinto Elemento.

  • The Wire: e já lá vão 21 anos

    The Wire: e já lá vão 21 anos


    Há séries que desafiam as noções de subjectividade sobre grandeza e entram numa concórdia geral, podendo haver apenas pequenas discórdias sobre a posição a ocupar numa qualquer lista pessoal de melhores séries já criadas e vistas por milhões.

    Sabemos que, ao longo do tempo, a posição de número 1 é, e tem de ser, volátil ou dinâmica, para que haja espaço para o que ainda não foi feito, e para que nos possamos surpreender. Decorre, portanto, que este lugar fique ou vazio ou se mostre plástico.

    Porém, lugares à parte, haverá sempre um pequeno número de obras que, por mais do que uma razão, teimam em ficar na memória e tornam-se até um arquétipo, que só é possível se sobreviverem ao teste do tempo e assim servirem de inspiração para outras ideias futuras.

    É o caso de The Wire.

    Passaram este mês de Junho, os 21 anos daquela que é (na minha opinião) a melhor série policial já criada, e que deve figurar nos lugares cimeiros das melhores séries de televisão.

    São muitas as razões que levam The Wire ao lugar onde merece estar, e a homenagem é tão evidente como essencial para os milhões de apreciadores. E para aqueles que ainda a possam ver.

    Em primeiro lugar, como o seu criador teve um jornalista com um passado em jornalismo criminal, David Simon, e também Ed Burns, um ex-polícia tornado escritor.

    David Simon, nascido em Washington, trabalhou 12 anos como repórter policial no The Baltimore Sun, o que lhe conferiu um conhecimento acentuado sobre a criminalidade daquela cidade, tendo-lhe servido como inspiração para os seus primeiros trabalhos de ficção: Homicide: a year on the killing streets (1991) onde relata o seu testemunho após um ano de colaboração com a unidade de homicídio da Polícia de Baltimore; e mais tarde, em 1997, The corner, uma história sobre as vidas dos passadores e vendedores de droga nas esquinas da cidade, claro está, de Baltimore, onde já colaborou com Ed Burns.

    Este livro deu lugar a uma minissérie de seis episódios no ano 2000 e recebeu três Emmys, para melhor série, melhor realizador (Charles C. Dutton) e melhor escrita para minissérie, este último para David Simon, marcando a sua primeira adaptação de um livro para televisão.

    Por sua vez, Ed Burns é um veterano do mal afamado Vietnam, que mais tarde se tornou um detective da polícia de Baltimore. Antes de se reformar, deu ainda sete anos da sua vida à profissão de professor. Após o sucesso do livro e minissérie The corner, onde Burns tem também créditos como escritor da adaptação televisiva, embora a chefia pertença a Simon.

    The Wire é assim uma consequência de um repositório dos conhecimentos adquiridos pelos seus escritores. É, antes de mais, esta a chave do seu sucesso, criada por pessoas que sabem do que por lá se passava e viram em primeira mão os assuntos sobre os quais depois se debruçam, o que confere uma autenticidade indiscutível.

    Embora se possa afirmar que existe um protagonista, Jimmy Mcnulty, interpretado pelo actor britânico Dominick West, The Wire não se cinge às histórias de um polícia nem a episódios individuais separados como as séries policiais clássicas do género Law & Order. Desta forma o verdadeiro protagonista é Baltimore e tudo o que acontece nesta cidade do estado de Maryland.

    As cinco temporadas, que entre 2002 e 2008 deliciaram os seus fãs, contam as histórias dos polícias, criminosos e políticos, e exploram vários sectores e locais da cidade de Baltimore e as suas idiossincrasias. Esta é também umas das outras chaves do seu sucesso: contar várias histórias a um ritmo paulatino, onde o espectador se imersa nas vidas de personagens com e sem longevidade, e onde nunca se sabe quem morre e quem vai ficando. Isto tudo dentro de uma grande e longa história de 60 episódios.

    A vida de todas estas personagens roda à volta das relações de poder entre si e ao jogo de rato e gato entre todos os intervenientes. Ao longo da série podemos ver como o arco das personagens é criado consoante as suas posições hierárquicas, a sede de poder hegemónico e o que farão para manter ou subir nos respectivos rankings. The Wire é também uma série sobre ascensões e quedas e a forma como uns caem e outros emergem, e onde os poderosos exploram (enquanto podem) os mais fracos numa relação de interdependência.

    Embora tenha um elenco com algumas caras conhecidas do grande público – como Idris Elba, Wendell Pierce, Lance Reddick e Aidan Gillen –, The Wire não dependeu da popularidade passada de uma estrela principal. Por isso, é o ensemble que faz a série resultar bem, tal como a humanização das personagens, através do storytelling. Esta é, na verdade, outra das chaves do seu sucesso.

    Não menos importante são os sectores descritos da cidade de Baltimore. Se numa das temporadas o foco vai para os estivadores, sindicatos e as ilegalidades cometidas pelos seus representados, The Wire traz também à luz os problemas do ensino e das relações entre filhos de criminosos (alunos) e professores bem intencionados, algo que é baseado na experiência directa de Ed Burns. Há lugar ainda para a corrupção política, racismo, pobreza e os media.

    David Simon

    Outro aspecto que fez de The Wire um sucesso, para além da imoralidade que rasga por completo as convenções clássicas do bom e do vilão, é a vertente estética. Existe uma sensação de documentário enfatizada pela falta de música, que normalmente serve o propósito de manipular o espectador para uma emoção pré-pensada. Os sons mais utilizados são os próprios da cidade, como as buzinas, os tiros, as sirenes e som de fundo, que ajudam à imersão da audiência em cada episódio, e transformando a série numa longuíssima metragem.

    Ainda há que adicionar dois pormenores interessantes, que podem passar despercebidos mas que também ajudam a explicar o sucesso desta série.

    O primeiro é a música do genérico, Way down in a hole”, original de Tom Waits, que se mantém ao longo das cinco temporadas, mas nunca é tocada pelos mesmos, tendo participações de The Neville Brothers e The Blind Boys of Alabama, entre outros.

    Ed Burns

    O outro pormenor são as frases no início de cada episódio, que constituem uma linha de diálogo de uma das personagens que aí se destaca, criando assim mais uma forma de manter o espectador colado ao ecrã à espera de saber de quem se trata.

    The Wire foi nomeada 54 vezes e recebeu 16 prémios durante os seus anos de emissão. Tem uma pontuação de 9,3 em 10 no ranking do site de referência IMDB e 94% no Rotten Tomatoes.

    Está ainda disponível no HBO Portugal e mais que uma “granda” série, (perdoem o vernáculo) é uma série do caraças!

  • Rabo de Peixe

    Rabo de Peixe

    Título

    City on the Hill (2019)

    Género

    Drama: Crime

    País de origem

    Estados Unidos da América

    Plataforma

    HBO Max

    Criador

    Chuck Maclean

    Actores principais

    Fevin Bacon; Aldis Hedge; Jill Hennessy

    Nota

    7/10

    Recensão

    Originalmente distribuída pela rede de canais televisivos Showtime, em 2019, City on the hill é uma série norte-americana desenvolvida por Chuck Maclean, baseada numa história criada pelo famoso actor Ben Affleck, que, a par de Matt Damon, também a produz. Recordemos que esta dupla ganhou o Óscar Melhor Argumento em 1997 por O bom rebelde (Good will hunting), onde também se destacava o malogrado Robin Williams.

    City on the hill é um drama protagonizado por Kevin Bacon e Aldis Hodge, tendo como cenários os anos 90 na cidade de Boston, com a premissa de uma cooperação em constante conflito entre o agente do FBI Jackie Rohr (Bacon) e o Procurador-Geral Adjunto Decourcy Ward (Hodge). Conta ainda, em destaque, com a participação de Jill Hennessy, no papel de Jenny Rohr, mulher de Jackie.

    Bacon representa um agente veterano em final de carreira, cuja aprendizagem tem tudo de old school. Corrupção, abuso de drogas e maneirismos fazem de Jackie Rohr um polícia tão desprezível quanto necessário para a trama, onde a fronteira entre anti-herói e vilão se esvanece muitas vezes e só de quando em vez a moralidade aparece.

    Já Hedge é o oposto: ainda jovem, é um idealista, incorruptível, mas ambicioso, havendo linhas que não cruza, embora sabendo que , por vezes, há que “fechar os olhos” para apanhar criminosos e trazê-los à justiça.

    City on the hill não é, em todo o caso, uma história de detectives, nem um clichê típico de series de advogados. Junta sim dois aspectos conhecidos para criar um enredo bastante mais original e interessante, onde se explora a pobreza, o crime e até o racismo institucionalizado numa cidade como Boston.

    Não é propriamente surpreendente que a acção seja passada em Boston, porque tanto Maclean como Affleck e Damon foram criados nesta cidade do Estado de Massachussetts – e o Óscar que arrecadaram com O bom rebelde também tem aí o seu cenário.

    Disponível na plataforma HBO Max, City on the hill conta com três temporadas num tempo médio de 55 minutos por cada um dos seus 26 episódios. E se outros motivos não houvesse, aproveitem para assistir à brilhante representação da “decadência” de Kevin Bacon.

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  • James Bond, 60 anos

    James Bond, 60 anos


    Há uma semana, no dia 8 de Maio, completou-se 60 anos da estreia em Portugal de Dr. No, o primeiro filme de James Bond, talvez a maior saga do cinema anglo-saxónico, que ainda hoje perdura. A estreia em território português fez-se no mesmo dia em que foi visto pela primeira vez nos Estados Unidos. No Reino Unido, o filme estreara em Outubro de 1962.

    Protagonizado pelo já falecido actor escocês Sean Connery, este filme é exibido em plena Guerra Fria e já numa altura onde o império britânico é substituído pelos Estados Unidos naquilo que é a hegemonia política, social e cultural.

    Dr. No começa com a morte de um agende do MI6 na Jamaica, obrigando a uma investigação pelo Governo britânico através do seu agente 007. Aqui é introduzida a personagem americana Felix Leiter, um agente da CIA que, por um lado, representará, ao longo dos vários filmes da saga, uma amizade entre o Reino Unido e os Estados Unidos, mas, por outro, cria também uma sensação de superioridade dos serviços secretos britânicos. E a propaganda se inicia.

    No decurso desta investigação é introduzida a personagem Honey Ryder, (Ursula Andress), sendo que aqui que começa o estereótipo da Bond girl. A sexualização de Ryder é obvia, quer pelo fato de banho que usa, pela forma de sair da água como que se de uma sereia se tratasse.

    Esta erotização das Bond girls, como uma espécie de objecto para ser olhado, como sugere Laura Mulvey na sua formulação do male gaze, torna-se prática comum nesta saga ao longo de várias décadas.

    Porém, se a erotização é uma constante das personagens femininas, não é menos constante a sua dependência e sujeição aos desejos do agente secreto e à sua perícia para a sobrevivência. Assim, as mulheres de Bond obedecem aos valores do pós-guerra, em que a mulher serve para ser olhada e o homem é quem toma as rédeas da acção e sucesso – e, por isso, lhe é superior.

    Bond é assim uma representação do modelo do hyper másculo, que consegue tudo o que o homem comum anseia. O sucesso com as mulheres, vencer todas as lutas, disparar a arma (um claro sinal fálico), que é melhor do que as outras, e finalmente conduzir o carro que todos querem. Bond é, assim, aquele que todos querem ser e, por isso mesmo, o homem impossível, o que o torna num paradoxo.

    Dr. No introduz também os temas da guerra espacial e da ameaça nuclear. A personagem Dr. Julius No deseja sabotar o lançamento espacial em Cape Canaveral, o local nos Estados onde são lançadas as naves hegemónicas.

    Como parte do seu arsenal de sabotagem Dr. No, tem um reactor nuclear que ameaça a paz mundial. A missão de 007 é impedir que o vilão atinja o seu objectivo.

    Naturalmente, a implicação da missão de James Bond representa a sagacidade dos serviços secretos britânicos que são os únicos que conseguem salvar o mundo da ameaça nuclear. Salvam também os “pobres” americanos que apesar da sua pretensa superioridade, precisam da determinação e das habilidades de 007.

    Neste sentido, James Bond mostra-se claramente um produto de propaganda britânica num mundo que mudou a seguir à II Guerra Mundial. É também uma salvaguarda dos valores de então.

    Porém, e muito devido à sua longevidade, esta saga tornou-se numa montra histórica onde se pode ver as mudanças da cultura ocidental. Se é verdade que começa com bastante misoginia, frieza e distanciamento emocional, 007 vai, ao longo dos anos, sofrendo mudanças que reflectem os zeitgeists.

    Por exemplo, Roger Moore é já um actor que traz algum humor aos écrans. Tem um riso mais fácil e os one-liners típicos destes filmes resultam melhor, muito embora a misoginia se mantenha.

    Com Daniel Craig, introduzido em 2006 em Casino Royale, notam-se as principais diferenças desta personagem complexa, e que se observam também nos seus inimigos.

    Estamos já longe do inimigo soviético, do General Gogol, ou da luta dos mujahideens – temas que nos anos 80 e 90 ainda faziam parte dos filmes com Roger Moore e Timothy Dalton.

    Em Casino Royale, a Bond girl, protagonizada pela actriz de origem francesa, Eva Green, é já uma mulher mais autónoma e, embora a erotização se mantenha, é já uma arma ao serviço da feminidade. Bond apaixona-se e, por isso, assistimos a um lado emocional da personagem, a sua vulnerabilidade e por sua vez, a fragilidade que assim o humaniza e o aproxima do homem comum.

    Introduz-se assim alguma paridade – que já antes havia sido tentada no último filme de Piers Brosnan, onde a Bond girl, Jinx, (Halle Berry) é uma agente da CIA que entra nos confrontos físicos e protagoniza sequências de acção independentes de Bond.

    Curiosamente, Casino Royale é o primeiro livro do autor Ian Fleming e, se deixarmos de lado a comedia de Peter Sellers em 1967, somente no século XXI o filme acaba por ser produzido.

    De acordo com um documentário da BBC de 2020, este livro é baseado nos tempos vividos em Portugal por Ian Fleming, quando era soldado britânico na II Guerra Mundial.

    Sean Connery, o pimeiro James Bond, e o escritor Ian Fleming (1908-1964), “pai” da saga 007.

    Alegadamente, o autor esteve hospedado num hotel da zona do Estoril, perto do Casino onde terá conhecido um espião de nome Dusko Popov, servindo de inspiração para criar 007. Fleming nunca chegou a confirmar esta alegação, e em 1964 com mais de 20 livros escritos morre, aos 56 anos.

    Daniel Craig é também o primeiro Bond a introduzir o tema da morte do agente secreto, ao ser o primeiro 007 a cair em combate num filme, e assim parece confirmar a teoria que Bond é um nome atribuído a um agente, e não um nome próprio.

    James Bond tem agora 60 anos, 27 filmes e continuará. Está para breve o anúncio do próximo actor que substituirá Daniel Craig. De qualquer forma, seguro é que continuará a chegar aos cinemas e a reflectir os temas da cultura actual. Talvez por, pelo menos, mais 60 anos. E ainda bem!

  • Night Agent

    Night Agent

    Título

    City on the Hill (2019)

    Género

    Drama: Crime

    País de origem

    Estados Unidos da América

    Plataforma

    HBO Max

    Criador

    Chuck Maclean

    Actores principais

    Fevin Bacon; Aldis Hedge; Jill Hennessy

    Nota

    7/10

    Recensão

    Originalmente distribuída pela rede de canais televisivos Showtime, em 2019, City on the hill é uma série norte-americana desenvolvida por Chuck Maclean, baseada numa história criada pelo famoso actor Ben Affleck, que, a par de Matt Damon, também a produz. Recordemos que esta dupla ganhou o Óscar Melhor Argumento em 1997 por O bom rebelde (Good will hunting), onde também se destacava o malogrado Robin Williams.

    City on the hill é um drama protagonizado por Kevin Bacon e Aldis Hodge, tendo como cenários os anos 90 na cidade de Boston, com a premissa de uma cooperação em constante conflito entre o agente do FBI Jackie Rohr (Bacon) e o Procurador-Geral Adjunto Decourcy Ward (Hodge). Conta ainda, em destaque, com a participação de Jill Hennessy, no papel de Jenny Rohr, mulher de Jackie.

    Bacon representa um agente veterano em final de carreira, cuja aprendizagem tem tudo de old school. Corrupção, abuso de drogas e maneirismos fazem de Jackie Rohr um polícia tão desprezível quanto necessário para a trama, onde a fronteira entre anti-herói e vilão se esvanece muitas vezes e só de quando em vez a moralidade aparece.

    Já Hedge é o oposto: ainda jovem, é um idealista, incorruptível, mas ambicioso, havendo linhas que não cruza, embora sabendo que , por vezes, há que “fechar os olhos” para apanhar criminosos e trazê-los à justiça.

    City on the hill não é, em todo o caso, uma história de detectives, nem um clichê típico de series de advogados. Junta sim dois aspectos conhecidos para criar um enredo bastante mais original e interessante, onde se explora a pobreza, o crime e até o racismo institucionalizado numa cidade como Boston.

    Não é propriamente surpreendente que a acção seja passada em Boston, porque tanto Maclean como Affleck e Damon foram criados nesta cidade do Estado de Massachussetts – e o Óscar que arrecadaram com O bom rebelde também tem aí o seu cenário.

    Disponível na plataforma HBO Max, City on the hill conta com três temporadas num tempo médio de 55 minutos por cada um dos seus 26 episódios. E se outros motivos não houvesse, aproveitem para assistir à brilhante representação da “decadência” de Kevin Bacon.

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  • Mayor of Kingstown

    Mayor of Kingstown

    Título

    City on the Hill (2019)

    Género

    Drama: Crime

    País de origem

    Estados Unidos da América

    Plataforma

    HBO Max

    Criador

    Chuck Maclean

    Actores principais

    Fevin Bacon; Aldis Hedge; Jill Hennessy

    Nota

    7/10

    Recensão

    Originalmente distribuída pela rede de canais televisivos Showtime, em 2019, City on the hill é uma série norte-americana desenvolvida por Chuck Maclean, baseada numa história criada pelo famoso actor Ben Affleck, que, a par de Matt Damon, também a produz. Recordemos que esta dupla ganhou o Óscar Melhor Argumento em 1997 por O bom rebelde (Good will hunting), onde também se destacava o malogrado Robin Williams.

    City on the hill é um drama protagonizado por Kevin Bacon e Aldis Hodge, tendo como cenários os anos 90 na cidade de Boston, com a premissa de uma cooperação em constante conflito entre o agente do FBI Jackie Rohr (Bacon) e o Procurador-Geral Adjunto Decourcy Ward (Hodge). Conta ainda, em destaque, com a participação de Jill Hennessy, no papel de Jenny Rohr, mulher de Jackie.

    Bacon representa um agente veterano em final de carreira, cuja aprendizagem tem tudo de old school. Corrupção, abuso de drogas e maneirismos fazem de Jackie Rohr um polícia tão desprezível quanto necessário para a trama, onde a fronteira entre anti-herói e vilão se esvanece muitas vezes e só de quando em vez a moralidade aparece.

    Já Hedge é o oposto: ainda jovem, é um idealista, incorruptível, mas ambicioso, havendo linhas que não cruza, embora sabendo que , por vezes, há que “fechar os olhos” para apanhar criminosos e trazê-los à justiça.

    City on the hill não é, em todo o caso, uma história de detectives, nem um clichê típico de series de advogados. Junta sim dois aspectos conhecidos para criar um enredo bastante mais original e interessante, onde se explora a pobreza, o crime e até o racismo institucionalizado numa cidade como Boston.

    Não é propriamente surpreendente que a acção seja passada em Boston, porque tanto Maclean como Affleck e Damon foram criados nesta cidade do Estado de Massachussetts – e o Óscar que arrecadaram com O bom rebelde também tem aí o seu cenário.

    Disponível na plataforma HBO Max, City on the hill conta com três temporadas num tempo médio de 55 minutos por cada um dos seus 26 episódios. E se outros motivos não houvesse, aproveitem para assistir à brilhante representação da “decadência” de Kevin Bacon.

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  • Nação valente

    Nação valente

    Título

    City on the Hill (2019)

    Género

    Drama: Crime

    País de origem

    Estados Unidos da América

    Plataforma

    HBO Max

    Criador

    Chuck Maclean

    Autores principais

    Fevin Bacon; Aldis Hedge; Jill Hennessy

    Nota

    7/10

    Recensão

    Originalmente distribuída pela rede de canais televisivos Showtime, em 2019, City on the hill é uma série norte-americana desenvolvida por Chuck Maclean, baseada numa história criada pelo famoso actor Ben Affleck, que, a par de Matt Damon, também a produz. Recordemos que esta dupla ganhou o Óscar Melhor Argumento em 1997 por O bom rebelde (Good will hunting), onde também se destacava o malogrado Robin Williams.

    City on the hill é um drama protagonizado por Kevin Bacon e Aldis Hodge, tendo como cenários os anos 90 na cidade de Boston, com a premissa de uma cooperação em constante conflito entre o agente do FBI Jackie Rohr (Bacon) e o Procurador-Geral Adjunto Decourcy Ward (Hodge). Conta ainda, em destaque, com a participação de Jill Hennessy, no papel de Jenny Rohr, mulher de Jackie.

    Bacon representa um agente veterano em final de carreira, cuja aprendizagem tem tudo de old school. Corrupção, abuso de drogas e maneirismos fazem de Jackie Rohr um polícia tão desprezível quanto necessário para a trama, onde a fronteira entre anti-herói e vilão se esvanece muitas vezes e só de quando em vez a moralidade aparece.

    Já Hedge é o oposto: ainda jovem, é um idealista, incorruptível, mas ambicioso, havendo linhas que não cruza, embora sabendo que , por vezes, há que “fechar os olhos” para apanhar criminosos e trazê-los à justiça.

    City on the hill não é, em todo o caso, uma história de detectives, nem um clichê típico de series de advogados. Junta sim dois aspectos conhecidos para criar um enredo bastante mais original e interessante, onde se explora a pobreza, o crime e até o racismo institucionalizado numa cidade como Boston.

    Não é propriamente surpreendente que a acção seja passada em Boston, porque tanto Maclean como Affleck e Damon foram criados nesta cidade do Estado de Massachussetts – e o Óscar que arrecadaram com O bom rebelde também tem aí o seu cenário.

    Disponível na plataforma HBO Max, City on the hill conta com três temporadas num tempo médio de 55 minutos por cada um dos seus 26 episódios. E se outros motivos não houvesse, aproveitem para assistir à brilhante representação da “decadência” de Kevin Bacon.

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  • Great Yarmouth: Provisional Figures

    Great Yarmouth: Provisional Figures

    Título

    City on the Hill (2019)

    Género

    Drama: Crime

    País de origem

    Estados Unidos da América

    Plataforma

    HBO Max

    Criador

    Chuck Maclean

    Autores principais

    Fevin Bacon; Aldis Hedge; Jill Hennessy

    Nota

    7/10

    Recensão

    Originalmente distribuída pela rede de canais televisivos Showtime, em 2019, City on the hill é uma série norte-americana desenvolvida por Chuck Maclean, baseada numa história criada pelo famoso actor Ben Affleck, que, a par de Matt Damon, também a produz. Recordemos que esta dupla ganhou o Óscar Melhor Argumento em 1997 por O bom rebelde (Good will hunting), onde também se destacava o malogrado Robin Williams.

    City on the hill é um drama protagonizado por Kevin Bacon e Aldis Hodge, tendo como cenários os anos 90 na cidade de Boston, com a premissa de uma cooperação em constante conflito entre o agente do FBI Jackie Rohr (Bacon) e o Procurador-Geral Adjunto Decourcy Ward (Hodge). Conta ainda, em destaque, com a participação de Jill Hennessy, no papel de Jenny Rohr, mulher de Jackie.

    Bacon representa um agente veterano em final de carreira, cuja aprendizagem tem tudo de old school. Corrupção, abuso de drogas e maneirismos fazem de Jackie Rohr um polícia tão desprezível quanto necessário para a trama, onde a fronteira entre anti-herói e vilão se esvanece muitas vezes e só de quando em vez a moralidade aparece.

    Já Hedge é o oposto: ainda jovem, é um idealista, incorruptível, mas ambicioso, havendo linhas que não cruza, embora sabendo que , por vezes, há que “fechar os olhos” para apanhar criminosos e trazê-los à justiça.

    City on the hill não é, em todo o caso, uma história de detectives, nem um clichê típico de series de advogados. Junta sim dois aspectos conhecidos para criar um enredo bastante mais original e interessante, onde se explora a pobreza, o crime e até o racismo institucionalizado numa cidade como Boston.

    Não é propriamente surpreendente que a acção seja passada em Boston, porque tanto Maclean como Affleck e Damon foram criados nesta cidade do Estado de Massachussetts – e o Óscar que arrecadaram com O bom rebelde também tem aí o seu cenário.

    Disponível na plataforma HBO Max, City on the hill conta com três temporadas num tempo médio de 55 minutos por cada um dos seus 26 episódios. E se outros motivos não houvesse, aproveitem para assistir à brilhante representação da “decadência” de Kevin Bacon.

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  • The Big Lebowski: 25 anos da imprevisível magia do cinema

    The Big Lebowski: 25 anos da imprevisível magia do cinema


    Celebrou-se em Março os 25 anos do filme The Big Lebowski (TBL), primeiramente lançado nos cinemas a 6 de Março de 1998 nos Estados Unidos, mas chegado a Portugal apenas a 30 de Outubro desse ano.

    Dir-se-ia que foi só mais um filme, e perguntar-se-á o motivo de se escrever sobre este em particular quando tantos outros também celebram anos de existência. Pois bem: The Big Lebowski não é um filme qualquer, e os fenómenos que foi gerando à sua volta, ao longo dos anos, tornaram-se maiores do que ele próprio.

    Jeff Bridges, o Dude, em The Great Lebowski.

    Dois anos antes, os dois realizadores, os irmãos Cohen (Joel e Ethan), tinham dado à luz o aclamado Fargo, que venceu o Óscar pelo melhor argumento e melhor actriz, para uma magnífica Frances McDormand, a fazer de polícia grávida naquela pacata cidade do Dakota do Norte. A expectativa à volta do que viria a seguir era assim grande.

    Porém, nas bilheteiras The Big Lebowski foi uma desilusão e as receitas mal cobriram as despesas. As críticas também não foram meigas e apareceram as bad reviews que pareciam confirmar ser este um filme a ficar sem História.

    David Denby escreveu para a New York Magazine a defender que The Big Lebowski era filme demasiado incoerente para se poder explicar e que o protagonista, Jeff Bridges, se tinha sacrificado pelo conceito derrotista dos Cohen.

    O falecido Roger Ebert disse, por sua vez, em 1998 que The Big Lebowski era um filme que corria em todas as direcções e acabava por não ir para lado algum. Peter Howell escreveu, no Toronto Star, ser difícil aceitar que os realizadores eram os mesmos de Fargo.

    Daphne Merkin, na sua recensão para o The NewYorker era mais uma destas vozes negativas e, embora fizesse elogios à performance de Bridges, criticava a falta de estrutura narrativa, o exagero das referências ao judaísmo e a falta de senso comum de Joel e Ethan. Dave Kehr chamou-lhe uma ideia cansada e um filme episódico e despreocupado.

    Enfim, tudo parecera falhar, e The Big Lebowski estava aparentemente destinado a ser um filme que os irmãos Cohen desejariam que o Mundo esquecesse.

    Porém, é o tempo que cria os clássicos, e o hoje é um mau julgador.

    Existe alguma ambivalência no que toca à definição de filmes de culto. Certo é que há filmes que criaram uma legião de “cultistas” que ainda hoje perdura – isto independentemente do seu sucesso ou falta deste, nas bilheteiras.

    De qualquer forma, se a “alta cultura” inicialmente condenou The Big Lebowski, automaticamente também criou as sementes para uma “baixa cultura” que não se revê nas críticas de peritos ou nas expectativas de intelectuais.

    Esta “baixa cultura” é normalmente formada por pessoas que vêem os chamados midnight movies que, como indica o nome, são filmes B, transmitidos a hora tardia, geralmente com o orçamento baixo, que tiveram origem nos anos 50, mas que depois do sucesso de filmes como El topo (1970) e mais tarde The Rocky Horror Picture Show (1975) começaram a atrair mais e maiores audiências.

    Ainda assim, esta legião de fãs configura uma oposição à “alta cultura” e ao mainstream, vendo-se a si mesma como “transgressora” que visiona filmes nas zonas suburbanas dos Estados Unidos a horas também elas desobedientes dos horários ditos normais, criando assim uma ritualização. 

    The Big Lebowski foi um desses filmes transmitidos nos midnight movies, desde o New Beverly Cinema no ano 2000, Nickelodeon Theatre em 2002, e em 2007 no New York City’s Sunshine Cinema, Milwaukee’s Rosebud Cinema Drafthouse, e no San Francisco’s Clay Theatre, cruzando assim várias regiões dos Estados Unidos.

    Em 2002 na cidade de Louisville, no Estado do Kentucky, foi assim criado o primeiro Lebowski Festival a partir da ideia de dois fãs, Will Russell e Scott Shuffitt. Não foi propriamente um grande festival, uma vez que só apareceram 150 pessoas e não se podia vender bebidas alcoólicas.

    Mas a semente germinou, e actualmente é um festival organizado em mais de 30 cidades americanas, com a presença dos actores principais, e onde os participantes mascaram-se com as indumentárias das personagens do filme, jogam bowling e citam frases do filme uns aos outros.

    No mesmo ano do primeiro festival foi feito o lançamento de DVD de The Big Lebowski em conjunto com outro filme que abordava o tema do consumo de marijuana. Três anos depois, em 2005, foi lançado o Collector’s Edition e o Achiever’s Edition, este último já com o nome que os fãs do filme davam já a si mesmos, certificando assim The Big Lebowski como um filme de culto.

    No décimo aniversário saiu mais um DVD que vendeu perto de 2,5 milhões de unidades. No vigésimo aniversário, em 2018, essas vendas duplicaram. O estatuto de filme de culto estava criado. The Big Lebowski tinha ganhado mais que uma segunda vida, era agora um fenómeno. Talvez uma vida eterna.

    Mainpage do culto Dudeism.

    Mas as particularidades não se ficam por aqui. The Big Lebowski conseguiu a proeza de servir de inspiração para a “criação” de uma religião e filosofia de vida, que dá pelo nome de Dudeism – reconhecida pelo Governo norte-americano e conta com mais de 600 mil padres ordenados.

    Oliver Benjamin, o seu criador, baseia esta religião no conceito de abiding, ou seja, viver no presente, sem se preocupar com o futuro, e vai buscar semelhança a filosofias orientais como o Taoismo, Budismo e Sofismo. Há apenas uma grande regra a seguir: “não sejas um idiota, trata bem as pessoas”.  No website deste “culto”, por uns trocos pode tornar-se um padre, aceder a livros e até tirar um curso na Abide University.

    A influência de The Big Lebowski faz-se sentir também no continente europeu. Desde restaurantes em Glasgow e Edinburgh, sob o nome Lebowskis, onde as bebidas têm o nome das personagens do filme, até ao Grand Café Lebowski em Utrecht, passando em Paris pelo Le Dude e em Dresden pelo Lebowski Bar.

    É de salientar que alguns dos críticos originais de 1998 fizeram, entretanto, o seu mea culpa, e reviram os seus textos. Houve até quem dissesse, na sua revisão, que poderia ter sido consequência de falta de oxigénio e cansaço, que não lhe permitiu escrever uma recensão em condições.

    Joel e Ethan Cohen, a dupla que realizou The Great Lebowski.

    Hoje, The Big Lebowski integra o National Film Registry, que é um corpo que escolhe filmes todos os anos para preservação futura devido à sua importância cultural, histórica ou estética. Ganhou, portanto, um lugar na História do Cinema.

    E sobretudo mostrou que um filme pode sobreviver ao seu tempo, às (más) críticas iniciais, e não obedecer a muitas regras para ser bom. 

    Por outro lado, mostra-se interessante observar as diversas catalogações deste filme. Agora, uns consideram-no uma comédia, outros metem-lhe um pouco de neo-noir.  De qualquer forma, não é fácil dizer qual é o tema deste filme, até porque não é a sua história que tanto fã agremiou. Foram sobretudo as personagens, os seus diálogos e o bowling. E há mais o resto, que é tudo o que se quiser inventar.